Laços que transformam: como o apadrinhamento e a entrega legal dão às crianças um lar de amor e cuidado
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- 09-10-2025
“O melhor cheiro do mundo é o cheiro de madrinha e de padrinho.” Essa frase, dita por uma criança acolhida, carrega a essência do programa de apadrinhamento de crianças e adolescentes “Estreitando Laços”, do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). Para Ana Carolina de Mendonça Romcy, psicóloga e madrinha de quatro irmãos, ouvir aquelas palavras foi a prova de que estava no caminho certo. “Naquele momento percebi que nossa presença era acolhimento, segurança, amor. Era o cheiro de casa.”
O desejo de se tornar madrinha nasceu a partir de uma reportagem sobre o programa. “Achei muito especial a possibilidade de participar da vida de uma criança — oferecer afeto, amor e incluí-la na rotina de uma família”, conta Ana Carolina. Ao lado do marido, Tiago, ela decidiu abrir as portas de sua casa e de sua vida para acolher crianças, tornando-se uma presença constante de cuidado, brincadeiras, histórias e risadas que enchem o lar de música, alegria e significado.
O apadrinhamento é capaz de criar vínculos de afeto, segurança e referência emocional para crianças e adolescentes em acolhimento, permitindo-lhes experimentar o calor de uma família e o amor que tanto necessitam. Existem três modalidades de participação: o apadrinhamento afetivo, que permite visitas, passeios e convivência nos finais de semana e férias escolares; o apadrinhamento financeiro, que contribui com recursos para atividades extracurriculares, produtos essenciais ou tratamentos médicos, sem necessidade de contato direto; e a prestação de serviços, voltada para apoiar a unidade de acolhimento, oferecendo reforço escolar, recreação, música, cuidados de saúde ou atenção a bebês e crianças pequenas.
O juiz Deusdeth Rodrigues, coordenador das Varas da Infância e Juventude de Fortaleza, explica a importância do programa: “O apadrinhamento não tem relação direta com a adoção, mas também fortalece vínculos afetivos e sociais, transformando vidas. Seu propósito é promover o bem-estar de crianças e adolescentes, garantindo-lhes oportunidades de convivência familiar e comunitária”.
Para se tornar padrinho ou madrinha, é necessário procurar uma Vara da Infância e Juventude ou a Coordenadoria de Processos Administrativos e Judiciais da Infância e Juventude em Fortaleza, receber orientação sobre as modalidades, participar de encontros com psicólogos e assistentes sociais e, a partir da autorização judicial, iniciar o vínculo afetivo com a criança.
Outro programa igualmente importante é a Entrega Legal, que garante a mães ou responsáveis entregar seus filhos à Justiça de forma segura, preservando a vida e os direitos da criança. Trata-se de um ato que reflete o direito da mulher de decidir sobre a maternagem, seja por não estar preparada, por questões psicológicas ou financeiras, ou pela ausência de apoio familiar, e, ao mesmo tempo, protege o direito da criança de ter uma família capaz de acolhê-la com amor e responsabilidade.
Desde 2021, a entrega responsável está regulamentada no Ceará, e a Lei n° 13.509/2017 garante que gestantes ou mães que manifestem interesse sejam amparadas pela Justiça. O servidor da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional (Cejai/TJCE), Deusimar Rodrigues de Alencar, afirma: “Ser pai ou mãe não é gerar biologicamente um filho, mas acolhê-lo com afeto. As mulheres precisam ter o direito livre e consciente de entregar seu filho biológico para adoção.”
O processo de Entrega Legal é conduzido de forma humanizada e cuidadosa. A gestante ou mãe deve procurar a Vara da Infância e da Juventude, ou, se impossibilitada, receber atendimento do Conselho Tutelar. É necessário apresentar documentos como RG, CPF, comprovante de residência, exames médicos e, no caso de recém-nascidos, a certidão de nascimento.
Ao longo do processo, a mãe é acompanhada por psicólogos e assistentes sociais, que asseguram acolhimento, escuta qualificada e apoio emocional. Após o nascimento, a criança é encaminhada para adoção, sendo garantido à mãe o prazo de dez dias para eventual desistência. O propósito é assegurar que a entrega ocorra de forma legal, consciente e protegida, prevenindo situações de abandono ou entrega irregular e garantindo que a criança seja acolhida por uma família previamente habilitada no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA).
Os efeitos do apadrinhamento afetivo e da entrega legal na vida das crianças são profundos. Essas experiências contribuem para reduzir o sentimento de abandono, fortalecer a autoestima, estimular o desenvolvimento emocional e social e ampliar o acesso a oportunidades educativas, culturais e de saúde.
Para Ana Carolina e Tiago, a vivência vai muito além do simples gesto de doar tempo ou atenção. “Essas crianças trouxeram alegria para a nossa vida. Nossa casa tem brinquedos espalhados, bolo de chocolate no lanche, desenhos na televisão e curiosidade em cada pergunta. É uma rotina cheia de afeto, aprendizado e amor. Ser padrinho ou madrinha é participar da vida, acompanhar o crescimento, ensinar, brincar e, acima de tudo, amar”, relatam.







