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Direito de reformar

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07.10.2009 Opinião Pág.: 06
A Constituição Federal atingiu a maioridade ao completar vinte e um anos de promulgação, no último dia 5. Desde 1988, seu texto já foi alterado por diversas vezes, e mais 1.300 emendas estão à espera de votação no Congresso Nacional (só na Câmara dos Deputados, são 934, enquanto no Senado são outras 407 emendas, na fila)
Essa voracidade de mudança do texto constitucional cria um relativismo extremamente volátil, o que não é bom do ponto de vista do alicerçamento de uma cultura de respeito à Constituição. Muitos dos artigos não foram ainda nem sequer regulamentados para que se pudesse dizer que estão exauridos. Não podemos esquecer que a Constituição de 1946 foi demolida pelo golpe de 1964, sem que também muitos de seus artigos tivessem sido regulamentados.
Evidentemente, um texto constitucional deve acompanhar, de certa maneira, as transformações mais profundas da sociedade que a legitimou. Entretanto, às vezes se trata apenas da pressão de lobbies de interesses restritos, que usam de meios persuasivos nem sempre ajustados aos interesses gerais da sociedade. Assim, é preciso cautela. O mais seguro seria permitir que a própria sociedade pudesse propor emendas à Constituição, através de projeto de iniciativa popular, como ocorre em vários países.
Aliás, esse direito já foi conquistado em alguns dos estados da Federação que o incluíram em suas constituições. É o caso do Ceará, em recente atualização de seu texto constitucional. Por que não estender esse direito ao plano federal, no que tange à Constituição de 1988? Essa é uma proposta que está sendo defendida pelo constitucionalista Paulo Bonavides, com o apoio de conselheiros federais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e que consiste em propor às assembleias legislativas estaduais que utilizem sua prerrogativa de propor emenda à Constituição Federal (desde que a proposta seja aprovada por 50% mais uma das casas legislativas estaduais). Em que consistiria a proposta? Justamente, em permitir modificações na Carta, através de projeto de iniciativa popular. Dessa forma, essa questão não ficaria apenas no âmbito dos lobbies.
A ideia de se convocar uma Constituinte Exclusiva, com a dispensa do quórum de 2/3 para aprovação da reforma política e outros temas relevantes inconstitucional, pois o quórum foi estabelecido pelo poder constituinte originário. Um poder derivado, como o do Congresso, não tem legitimidade para isso. A própria Constituição oferece a solução: regulamentar e ampliar os mecanismos de democracia participativa, de modo a permitir que o próprio povo tenha a iniciativa de propor as mudanças, através de projetos de iniciativa popular, de referendos e plebiscitos. No mínimo, qualquer emenda constitucional deveria, antes de promulgada, ser levada a referendo. Com isso, se respeitaria o espírito da Constituição Cidadã.