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Debates e Ideias: Prescrição retroativa

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Opinião 16.05.2010
Chegou ao fim uma das maiores benesses à criminalidade/impunidade no nosso País: a prescrição retroativa do tempo considerado entre a data do ato delituoso até o recebimento da denúncia ou da queixa, ou seja, exatamente o período da realização/confecção do Inquérito Policial, nos crimes de médio e máximo potencial ofensivo.
É que a recente Lei nº 12.234, de 5 de maio de 2010, acaba de dar nova redação ao § 1º do art. 110, ao mesmo tempo revogando o § 2º do mesmo artigo, todos, do Código Penal, prescrevendo que a prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois e improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.
Outro ponto importante dessa Lei nº 12.234, foi a eliminação da prescrição de dois (2) anos. Hoje, a maior prescrição é de 20 e a menor de 3 anos, acabando com as benesses daqueles que, condenados por crime com pena inferior a um ano, sempre se beneficiavam da prescrição bienal.
Como menciono, há muitos anos, em meus Livros (Editoras Saraiva (SP), Lumen Juris (RJ), Conceito (SC), Malheiros (SP), Del Rey (MG), Unifor (CE) e em sala de aula, nunca vi um condenado por crime contra a antiga Lei de Imprensa não ser beneficiado com a prescrição de dois anos, embora esses condenados fiquem sujeitos a uma ação de indenização cível por atingir a honra alheia, já que a sentença penal que lhe concede a prescrição, não nega o fato nem a autora. Ao contrário, confirma-os.
Quem apenas ler, sem maior atenção, o art. 1º da novel Lei nº 12.234, fica com a equivocada ideia de que a chamada prescrição retroativa foi totalmente eliminada no nosso País, o que é um equívoco.
Na verdade a prescrição retroativa, ora extinta, não atinge os períodos posteriores ao recebimento da denúncia ou da queixa, eis que só colhe aquele tormentoso período entre a data do crime e o do recebimento das peças acusatórias, ou seja, o período da confecção do Inquérito Policial, nos crimes de médio e máximo potencial ofensivo, subsistindo, todavia, nos demais casos. Sempre defendi, nas mesmas publicações e em sala de aula, que o Juiz não era responsável pela ocorrência da prescrição retroativa, que compreendia ao tormentoso período entre a data do crime e a do recebimento da denúncia ou da queixa, porque não tinha como negar pedido de prorrogação de prazo à autoridade policial para busca de novas diligências, sob pena de ser acusado de estar atrapalhando a atividade policial ou favorecendo ao delinquente/indiciado.
Quando atuei na 4ª Vara Federal, no Ceará e em outras com competência criminal, sempre neguei à autoridade policial pedido de prorrogação de prazo para prosseguimento nas diligências no Inquérito mas a orientava que procurasse diretamente o Ministério Público porque ele é o órgão titular da ação penal, e quem sabe se o Inquérito já reúne ou não elementos para ofertar a respectiva denúncia.
É importante registrar que essa norma revogadora da prescrição retroativa é eminentemente de direito penal e, como tal, só se aplicará aos crimes cometidos depois de sua vigência, eis que não pode retroagir para prejudicar os condenados antes dela, sob pena de violar a própria Constituição Federal. E cumprir a Constituição é dever de todos, mormente de um juiz.
AGAPITO MACHADO
juiz federal e professor universitário