Conteúdo da Notícia

Competência em perigo

Ouvir: Competência em perigo

21.06.2009 Opinião Pág.: 03
É consenso que a Emenda Constitucional nº 45 de 2004 valorizou a Justiça do Trabalho, ampliando seu rol de competência material, mediante alteração no art. 114 constitucional.
Entretanto, sabe-se que a aplicação do referido artigo passa pelo processo de interpretação. É exatamente este ponto que merece maior atenção. Isto porque, aquele que diz a última palavra em interpretação constitucional é o Supremo Tribunal Federal – STF. Já aquele que possui a incumbência constitucional de solucionar os conflitos de competência estabelecidos entre juiz do trabalho e juiz comum é o Superior Tribunal de Justiça – STJ. Ocorre que tais Tribunais estão, através de interpretações distorcidas, esvaziando o ganho de competência que a Justiça do Trabalho conquistou com a Emenda Constitucional nº 45.
Exemplo disso consubstancia-se na liminar deferida no curso da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.395 de 2005, que retirou da competência trabalhista os conflitos entre servidores públicos regidos por regime jurídico-institucional e a Administração Pública, sendo certo que o Supremo vem decidindo, com base na referida ação, que os contratos temporários trazidos pelo art. 37, IX, da Constituição também não seriam de competência da Justiça do Trabalho, mesmo em casos de desvirtuamento do serviço temporário.
Recentemente a mesma Corte Superior, a despeito da própria CLT, decidiu pela incompetência da Justiça do Trabalho para executar de ofício contribuições sociais decorrentes do período contratual declarado.
De forma ainda mais preocupante vem agindo o STJ, ao editar as súmulas 363 e 366, a primeira retirando da competência da Justiça do Trabalho os conflitos estabelecidos entre profissionais liberais e tomadores e a segunda dizendo competir à Justiça Estadual processar e julgar ação indenizatória proposta por viúva e filhos de empregado falecido em acidente de trabalho.
Contudo, parece claro que nenhuma das súmulas do STJ merece amparo interpretativo mínimo. A primeira porque vai de encontro à própria literalidade do art. 114, I, da Constituição; e a segunda porque esquece que os elementos de caracterização da responsabilidade civil do empregador passam necessariamente pelo contrato de trabalho, independentemente de a vítima ter ou não morrido.
Percebe-se, portanto, que aos poucos STF e STJ estão esvaziando o ganho de competência da Justiça do Trabalho. Não se pode deixar que isso chegue a um caminho sem volta.
Konrad Saraiva Mota – Juiz do Trabalho e professor universitário