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7º Colóquio sobre Depoimento Especial: quando falar e ouvir se tornam atos de justiça e humanidade

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Num tempo em que tantas vozes são silenciadas ou mal interpretadas, o Judiciário cearense reafirmou seu compromisso com a escuta verdadeira. Nesta sexta-feira (30/05), aconteceu o 7º Colóquio sobre Depoimento Especial, realizado de forma virtual pelo Núcleo de Depoimento Especial (Nudepe) em parceria com a Escola Superior da Magistratura do Ceará (Esmec), e trouxe um convite potente: refletir sobre como se fala, mas principalmente, sobre como se ouve.

Com o tema “Conectando Vozes – TEA e o estabelecimento de limites e possibilidades na comunicação com depoentes nessa condição”, o evento se propôs a abrir caminhos mais humanos, técnicos e justos para a escuta de crianças e adolescentes com Transtorno do Espectro Autista (TEA), especialmente nos contextos sensíveis do Depoimento Especial.

A abertura do colóquio foi conduzida pela Secretária Executiva do Nudepe, Iana Martins Araújo, que acolheu os participantes destacando o propósito maior da iniciativa: promover conhecimento, escuta e transformação.

Logo em seguida, a desembargadora Tereze Neumann, coordenadora do Nudepe, compartilhou a importância do momento. “Este colóquio é uma oportunidade de conhecer estratégias, tirar dúvidas, aprimorar a forma como colhemos depoimentos de crianças e adolescentes com TEA. A transmissão desse conhecimento é valiosíssima. Precisamos avançar no atendimento qualificado e protetivo desse grupo tão específico.”

A fala da magistrada também reforçou que o colóquio faz parte das ações do Maio Laranja, campanha de combate à violência contra crianças e adolescentes. Um mês inteiro voltado à proteção, que culmina com este espaço de aprendizado e fortalecimento de práticas mais humanas dentro do Judiciário.

A escuta qualificada, como lembrou a desembargadora, é uma construção. E foi com essa base que o professor especialista Alexandre Dias Nunes de Melo, da Secretaria de Educação de Praia Grande (SP), conduziu sua palestra — unindo ciência, comportamento e sensibilidade.

“Quando se conhece um autista, se conhece apenas um autista. Cada pessoa dentro do espectro é única. Minha proposta aqui é oferecer uma abordagem cognitivista e comportamental que seja útil a vocês, que aproxime a prática do que há de mais relevante na ciência atual.”

O professor compartilhou aspectos fundamentais sobre o funcionamento cognitivo de pessoas com TEA, citando conceitos como coerência central fraca e déficit de teoria da mente, além dos cuidados práticos durante a escuta forense: evitar perguntas abertas ou expressões ambíguas, escolher palavras claras e precisas, respeitar a literalidade de muitos autistas — que podem ser, inclusive, excelentes depoentes por sua sinceridade e objetividade.

“É preciso clareza. Evitar vícios de linguagem como ‘correr até desmaiar’, pois o autista pode entender ao pé da letra. Muitos possuem dificuldades em captar o sentido global das coisas, mas são incrivelmente atentos aos detalhes. E nisso, a escuta ganha precisão se for conduzida com o cuidado necessário.”

Mais do que teoria, a palestra reforçou a importância do preparo técnico e emocional dos entrevistadores forenses. Afinal, comunicar-se bem com quem já foi ferido é, também, uma forma de reparação.

 

SAIBA MAIS

 

A lei nº 13.431/17 mudou a forma de ouvir vítimas e testemunhas crianças e adolescentes. E Depoimento Especial, hoje, é símbolo dessa transformação: uma escuta acolhedora, feita em ambiente pensado para o afeto e a segurança, com profissionais treinados para evitar a revitimização.

O Ceará já trilha esse caminho com o trabalho do Nudepe — que além de selecionar e monitorar os entrevistadores forenses, promove capacitações constantes e fortalece a cultura da escuta protetiva.

Ao final do encontro, a certeza que permanece é a de que falar e ouvir são, sim, atos de justiça. Mas precisam ser feitos com responsabilidade, empatia e conhecimento. Porque escutar uma criança é muito mais do que ouvi-la. É reconhecê-la. E é esse reconhecimento que o Judiciário cearense tem buscado a cada passo.

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