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Debates e Idéias:Transação na área tributária

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Opinião Pág. 03 29.11.2009
A transação é um instituto jurídico típico do Direito Privado, inerente às relações jurídicas que nascem da manifestação da vontade. A relação jurídica tributária não nasce da vontade, mas da lei, ou mais exatamente, nasce da incidência da lei sobre o fato descrito como hipótese de incidência tributária. Em princípio, portanto, a transação não é adequada no trato da relação tributária.
É certo que o Código Tributário Nacional refere-se à compensação como uma das causas de extinção do crédito tributário (art. 156, III), estabelecendo que a lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da relação tributária celebrar transações que, mediante concessões mútuas, importe em terminação de litígio e consequente extinção do crédito tributário (art. 171). E prescreve ainda que a lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso (art. 171, parágrafo único). Entretanto, nessas regras do CTN que se referem à transação vê-se claramente o caráter excepcional desse instituto no Direito Tributário. E desse caráter excepcional resulta a necessidade de não se ampliar, pela via da interpretação, o alcance das regras legais sobre a transação no âmbito da relação tributária.
O tema está a despertar interesse em face da Lei nº 14.505, de 18/11/2009, que em seu art. 6º admite sejam objeto de transação judicial débitos de natureza tributária para com a Fazenda Estadual, nos termos do art. 156, III e 171 do Código Tributário Nacional. E especialmente porque o § 1º, desse art. 6º, atribui ao regulamento a disciplina das condições e dos procedimentos que o Estado deverá observar para a realização da transação que importará em composição de conflitos ou terminação de litígios. Essa regra, como facilmente se vê, contraria o CTN quando delega ao Poder Executivo o estabelecimento das condições a serem observadas na transação. Além disto, ao se referir a composição de conflitos, permite interpretação ampliativa, inteiramente incompatível com os limites estabelecidos pelo Código Tributário Nacional, dando ensejo a práticas que terminam por transformar o tributo em instrumento político. Na verdade a transação só é admitida pelo Código Tributário Nacional para pôr fim a litígio, como tal entendido o conflito que esteja posto em Juízo. E isto porque se supõe que na questão submetida à apreciação do Poder Judiciário as partes já definiram as suas pretensões e estas são do conhecimento público, como serão, também, as concessões mútuas que consubstanciam a transação. Além disto, considerando-se que o crédito tributário é um direito indisponível da Fazenda Pública, só a lei pode atribuir a autoridade que indica a competência para transigir, nas condições também indicadas na lei, de sorte que a transação a final vai favorecer qualquer contribuinte que se encontre naquelas condições e não será, por isto mesmo, uma transação no sentido que tem o instituto no campo de Direito Privado.
HUGO DE BRITO MACHADO
Professor Titular de Direito Tributário da UFC e presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários