Acordo inédito: Poderes Judiciário e Legislativo firmam parceria para implementar primeiro Escritório Social do Ceará
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- 23-10-2025
O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) firmou, nesta quinta-feira (23/10), Acordo de Cooperação Técnica (ACT) inédito com a Assembleia Legislativa do Estado (Alece) para implementar o primeiro Escritório Social no Ceará, que funcionará no Fórum Clóvis Beviláqua (FCB), em Fortaleza. A iniciativa integra o Plano Pena Justa e visa aprimorar o acolhimento de pessoas egressas do sistema prisional para promover a efetiva reinserção social, fortalecendo a cidadania.
“Eu quero registrar o ineditismo desse Acordo com o Legislativo. A crise no sistema prisional é do Brasil, não é uma situação peculiar do Ceará, e é preciso que o poder público dê condições, ferramentas, oportunidades para romper com esse ciclo de violência, de criminalidade. O Escritório Social é o lugar aonde pessoas egressas, saídas do sistema prisional podem ser orientadas do ponto de vista financeiro, de ter oportunidades de emprego, de educação. É a porta de entrada na sociedade”, explicou o presidente do TJCE, desembargador Heráclito Vieira de Sousa Neto, durante a assinatura do documento, na sede da Alece.
O presidente do Legislativo Estadual, deputado Romeu Aldigueri, falou sobre a importância da iniciativa e reforçou o ineditismo do Acordo, primeiro do país que envolve os dois Poderes para a implantação de um Escritório Social. “Vai servir de referência positiva para que outras Assembleias Legislativas país afora e outros Tribunais de Justiça possam fazê-lo. E daremos toda a nossa expertise, através da Comissão de Direitos Humanos, que é tão bem presidida pelo deputado Renato Roseno, com toda a sua assessoria, do Escritório Frei Tito de Direitos Humanos e do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Violência. Então, acredito que estamos no caminho certo, através da nossa responsabilidade social enquanto Poder Legislativo, dando a nossa contribuição efetiva para a gente ter uma cultura de paz, uma sociedade mais justa, mais organizada, mais fraterna”.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atualmente existem 48 Escritórios Sociais no Brasil, mas nenhum funciona a partir de parceria com o Legislativo.
ESCRITÓRIO SOCIAL
Conforme previsto no Acordo de Cooperação, o Núcleo de Apoio às Varas de Execução Penal (Navep) do FCB será transformado em Escritório Social e funcionará, sob a gerência do TJCE, com a participação de servidoras(es) cedidas(os) pela Alece. “Temos um perfil de profissionais de nível superior, do campo psicossocial e jurídico, que atuarão em parceria, no Fórum Clóvis Beviláqua, sob coordenação do Judiciário cearense, no atendimento a vítimas de violência e no atendimento a essa população egressa”, esclareceu o presidente licenciado da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alece, deputado Renato Roseno.
“As organizações armadas recrutam a partir de três vetores: reconhecimento, pertencimento; poder e autonomia; e inserção no mercado de consumo de massa. É preciso haver política pública para enfrentar cada um desses vetores, em especial na faixa de 15 a 29 anos. É a tarefa do Escritório Social”, salientou o parlamentar ao falar sobre a importância do serviço para a prevenção da violência.
Entre os serviços ofertados estão orientações e encaminhamentos para o acesso a políticas públicas de saúde, educação, assistência social, trabalho e renda, dentre outras ações para garantir mais oportunidades na retomada do convívio em liberdade civil, contribuindo para a verdadeira reinserção social e o fortalecimento da cidadania.
DESCENTRALIZAÇÃO
O supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Penitenciário e de Execução de Medidas Socioeducativas (GMF) do TJCE, desembargador Henrique Jorge Holanda da Silveira, destacou que o Escritório Social congrega e amplia serviços que eram oferecidos de forma isolada pelos Poderes Judiciário e Executivo. O magistrado acrescentou que o Plano Estadual Pena Justa prevê a descentralização dos Escritórios Sociais para contemplar um maior número de pessoas em ressocialização e familiares.
Na Capital, além da unidade que funcionará no FCB a partir desse Acordo com a Alece, há previsão de implantação de um Escritório Social em convênio com a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) para ampliar a atuação da Coordenadoria de Inclusão Social do Preso e do Egresso (Coispe). Também haverá a instalação do serviço em Juazeiro do Norte, na Região do Cariri, em parceria com SAP, e em Sobral, na Região Norte do Estado, com a participação da Prefeitura Municipal.
Para o coordenador do Núcleo de Políticas Penais do GMF, juiz Raynes Viana, possibilitar uma saída estruturada do sistema prisional é um caminho essencial para a redução da reincidência. “Dados da própria Secretaria de Administração Penitenciária demonstram que, das pessoas que são atualmente atendidas por programas de encaminhamento profissional e de capacitação, a reincidência é da ordem de apenas 5% que, frente aos indicadores normais de reincidência, é um número baixo que, obviamente, deve ser ainda mais trabalhado e reduzido com a implantação dos escritórios sociais.”
Além das pessoas citadas, participaram da assinatura do ACT os deputados estaduais Francisco de Assis Diniz, 1º secretário da Alece, e Davi de Raimundão, além do procurador-geral da Assembleia, Rodrigo Martiniano.
PENA JUSTA
A implantação de Escritórios Sociais em todas as localidades com estabelecimentos prisionais é uma das metas do Plano Nacional Pena Justa, construído pelo CNJ e pela Secretaria Nacional de Políticas Penais no contexto do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347 (ADPF 347), pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em outubro de 2023, a Corte reconheceu o estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro, caracterizado pela grave e sistemática violação de direitos fundamentais das pessoas privadas de liberdade, e apontou a existência de urgências para garantir a segurança e o bem-estar da população.
O Plano Nacional foi homologado no dia 18 de dezembro de 2024 e, a partir daí, os estados e o Distrito Federal começaram a elaborar suas ações regionais. No Ceará, o desenvolvimento do Plano Estadual começou, em 28 de fevereiro deste ano, por meio da Portaria Conjunta nº 01/2025, que implantou o Comitê Estadual de Políticas Penais (CEPP), reunindo os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo; Ministério Público; Defensoria Pública; Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB-CE); conselhos estaduais; universidades públicas e privadas; organizações da sociedade civil; movimentos sociais e entidades ligadas ao sistema de Justiça e aos direitos humanos.
No dia 22 de julho passado, o Comitê encerrou o último ciclo de reuniões da coordenação para a consolidação das propostas elaboradas pelas Câmaras Temáticas, que tiveram encontros também no mês de julho. Com escutas públicas nas regiões de Sobral e do Cariri, a equipe absorveu situações locais na elaboração do documento final.
Assinado no último dia 11 de agosto pelo presidente do TJCE, desembargador Heráclito Vieira de Sousa Neto, e pelo governador do Ceará, Elmano de Freitas, o Plano Estadual Pena Justa foi submetido ao STF e lançado, oficialmente, no último dia 26 de setembro.



