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Violência psicológica

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26.09.2010 viva
Porque tantas mulheres ainda se submetem e sofrem tripla jornada de sofrimento e agressões
Quando se fala em violência contra a mulher, logo vem à mente os tão visíveis e brutais atos físicos, certo? Porém, além de tapas, pontapés e espancamentos, há outro tipo de crime que machuca na mesma proporção que a agressão física e afeta diretamente a saúde: a violência psicológica.
Caracterizado sobretudo por agressões verbais, esse tipo de violência silenciosa representou este ano 62,79% das ameaças feitas junto ao Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, em Fortaleza. Em 2009, no mesmo período, o índice foi de 59,09%.
A violência mental sofrida pelas mulheres é tamanha, reconhece a juíza titular do Juizado da Mulher em Fortaleza, Rosa Mendonça, que muitas vezes elas são submetidas a uma tripla jornada de sofrimento, já que lidam com agressões de patrões, marido e filhos.
“É tão sutil, que a violência psicológica passa a fazer parte do cotidiano, chegando a ser confundida por algumas mulheres, e até pelos homens, como brutalidade, ignorância, estresse e estupidez”, esclarece Rosa Mendonça. Isso porque, por definição, violência psicológica “é qualquer conduta que cause à mulher dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento”.
Ou, ainda, “que vise degradar ou controlar ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”, segundo estabelecido pela Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (1994) e pela a Lei Maria da Penha (1996).
Deixando marcas
Segundo a assistente social, pesquisadora e livre docente da Universidade Estadual do Ceará, Maria do Socorro Osterne, “a violência psicológica pode se manifestar nas relações de gênero (entre namorados, noivos, amantes, conjugues ou qualquer parceiro íntimo), mas também entre pais e filhas, irmãos e irmãs, parentes, vizinhos”. Mas não se limita às relações familiares, de “amizades” e vizinhança. Ocorre, costumeiramente, no ambiente e nas relações de trabalho, na escola, na universidade, nos partidos políticos, enfim, é fenômeno transversal ao conjunto das relações sociais, esclarece.
Como enumeram a juíza e a assistente social, as agressões psicológicas se concretizam à medida que as mulheres, como muitas relatam ao Juizado da Mulher, são chamadas de: loucas, burras, histéricas, malas sem alça. Ou, então, são ridicularizadas pelo porte físico (gorda, magricela, pele e osso, relaxada, velha); criticadas em suas condutas como mães, amantes, profissionais; culpadas por todos os problemas que acontecem em casa e com os filhos; são desvalorizadas pelos trabalhos domésticos; ameaçadas de maus tratos; monitoradas com os horários; são proibidas de usar determinados tipos de roupas e, ainda, os companheiros fazem-nas se sentirem culpadas.
Com isso, explica Maria do Socorro Osterne, as relações interpessoais ficam seriamente comprometidas “à medida em que se constitui elemento inibidor da liberdade, de manifestação e do direito de oportunidades e vida plena, além de uma sociabilidade respaldada na ética da convivência”.
A partir dessas situações, existem consequências inevitáveis à saúde e ao bem estar da mulher e de toda a família. Como exemplifica a juíza Rosa Mendonça, “a violência não deixa marcas no corpo e não há exame de corpo de delito para atestar sua materialidade”.
Porém, como listam as especialistas, as mulheres submetidas à violência psicológica apresentam quadros recorrentes de dores de cabeça, obesidade ou perda de peso acelerada, problemas gástricos e digestivos, ginecológicos, cardíacos, fibromialgia, hipertensão arterial, entre outros. “O temor provocado pela ameaça causa perturbação na mente, na liberdade psíquica, impedindo completamente a livre determinação da vontade”, conclui a juíza titular do Juizado da Mulher em Fortaleza.
Sintomas frequentes
Uso e abuso de substâncias psicoativas e álcool;
Desordens na alimentação;
Desinteresse pela vida;
Atitude de isolamento;
Irritabilidade;
Dificuldade de
Concentração;
Facilidade para chorar;
Distúrbios do sono;
Ansiedade;
Depressão;
Sentimento de culpa;
Síndrome do pânico.
Fique por dentro
Saúde em risco
A organização Mundial de Saúde (OMS) classifica a violência contra a mulher como problema de saúde pública, afinal, foi levado em consideração as consequências econômicas e sociais, que interferem até no Produto Interno Bruto (PIB).
No tocante às consequências, a juíza Rosa Mendonça lembra que o Banco Mundial (BM) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bird) constataram que: um em cada cinco dias de falta no trabalho, em todo o mundo, tem como causa a violência domiciliar sofrida pelas mulheres; e que, a cada cinco anos, uma mulher que vive nessas condições perde um ano de vida saudável.
O estudo indica que as mulheres, com idades entre 15 e 44 anos, perdem mais anos de vida saudável, em função do estupro e da violência doméstica do que em decorrência de câncer de mama, de colo do útero e problemas relacionados ao parto, doenças coronarianas, respiratórias, Aids, acidentes no trânsito ou a guerra.
JANINE MAIA
REPÓRTER