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Solteiros adotam e realizam sonho de ser pai

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07.08.2010
Em Fortaleza, quatro homens estão em uma espera para ser pai. Não que suas companheiras estejam grávidas, mas porque eles compõem a tímida fila de pais solteiros que aguardam uma criança para adotar. Por isso, não será ainda este ano que eles vão comemorar, amanhã, o Dia dos Pais.
Entretanto, mesmo que esse número seja pequeno, se compararmos aos 114 casais na Capital, à espera por adoção, revela um dado significativo, pois segundo o Cadastro Nacional de Adoção, no ano passado, nenhum homem solteiro em Fortaleza, se cadastrou nessa fila.
No Brasil, atualmente, são 351 homens solteiros nessa situação. O número ainda é distante quando se fala em casais que desejam adotar uma criança. São 25.246 futuros pais e mães nessa fila, mas a estatística, segundo Anna Gabriella Pinto, chefe do Cadastro de Adoção do Fórum Clóvis Beviláqua, já revela uma mudança no perfil da família brasileira.
Herói
“Meus vizinhos e familiares me chamavam de herói, mas não eu entendia o porque. Só depois que vivi na pele o quanto era difícil cuidar de gêmeos sozinho, é que compreendi o quanto pais solteiros são heróis”, relata o professor e radialista Tadeu Nobre Rodrigues, 59 anos, que adotou dois meninos gêmeos recém-nascidos.
Para ele, se fôssemos contar essa história há 50 anos talvez ninguém acreditasse, pois era impensável, em uma sociedade tradicional paternalista, que um homem pudesse adotar uma crianças e educá-la sozinho sem a presença de uma esposa.
Tadeu Nobre conta que, mesmo diante de tantos avanços na lei da adoção, não foi fácil conseguir adotar seus filhos. Segundo ele, foram quatro anos visitando o Fórum da Capital, em busca de saídas para suprir o seu desejo de ser pai e ajudar crianças carentes. “A prioridade era sempre para casais que não pudessem ter filhos, depois casais que tinham filhos mas queriam adotar mais um, os homens solteiros estavam sempre em último lugar”, ressalta.
Porém, por meio de uma assistente social do Fórum, ele soube que o caminho mais fácil seria ele conhecer uma mulher grávida, sem condições financeiras para cuidar do filho e disposta a colocá-lo para adoção.
Foi então que o professor e radialista, por intermédio de amigos, conheceu uma adolescente de 19 anos, grávida, que se dispôs a ajudá-lo.
Ele conta que após os nascimentos das crianças o processo de adoção ocorreu quatro meses depois. “No início, não imaginava que eram gêmeos, quando soube fiquei desesperado, mas não desisti. Hoje, meus filhos já têm dois anos e três meses, e me sinto realizado quando eles me chamam de pai”, frisa.
Modelos de famílias como a do professor Tadeu Nobre, fazem parte de uma nova realidade social do Brasil, segundo a professora e psicóloga da família Heleni Barreira. Conforme ela, durante muito tempo, a ideia de família nuclear, composta por pai, mãe e filhos era o único modelo aceito pela sociedade, contudo atualmente existem diversos modelos.
Ela explica que nas famílias monoparentais, os pais e mães são solteiros, nas homoafetivas são homossexuais e as mosaicos são formadas por casais separados com filhos que se unem.
A psicóloga diz que ser pai é uma função que pode ser exercida por um homem casado ou solteiro e até por uma mulher, contanto que ele cumpra princípios básicos, oferecendo afeto, segurança, educação e ensinando as regras sociais.
De acordo com ela, as mudanças no contexto histórico, social e político causam alterações na estrutura da instituição família, e diz que, mesmo diante disso, pais e mães continuam sendo referência para construção social. “Diante de todas essas mudanças, homens solteiros começaram a desejar exercer a função de pais, e muitos desempenham esse papel com muita desenvoltura”, ressalta.
CONGRESSO NACIONAL
Propostas ampliam licença-paternidade
Se engana quem pensa que a única dificuldade vivida por pais solteiros que querem adotar uma criança, são os tramites legais. A ausência de um prazo maior na licença paternidade no Brasil, também dificulta o processo. Atualmente, o direito previsto pela Constituição Federal é de apenas cinco dias.
Mas, essa realidade pode mudar, pois pelo menos dez projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional discutem a ampliação da licença paternidade. Há propostas que aumentam o direito para até 30 dias, mas o projeto mais avançado e com maior consenso prevê licença remunerada de 15 dias após o nascimento do filho.
A licença para os pais é um direito previsto na Constituição de 1988. Contudo, o texto deixa claro que se trata de um prazo provisório até que uma lei específica regulamente o direito. Vinte e dois anos depois, o Congresso ainda não aprovou uma lei sobre o assunto.
A pediatra e presidente da Sociedade Cearense de Pediatria, Regina Portela, afirmou que a tendência é de aprovação da ampliação para 15 dias. Pois, segundo ela, nas duas primeiras semanas após o parto a presença do pai é essencial, tanto no acompanhamento ao pediatra, quanto na ajuda com bebê. “Acho que 30 dias é um prazo muito elástico, por isso nós pediatras acreditamos que duas semanas são suficientes”, diz
Para a pediatra, a ampliação da licença-paternidade concede o direito de estar presente. “O direito de participar desse momento decisivo, de permitir à criança a identificação com sua figura e assegurar dessa maneira a construção de um vínculo afetivo amplo”, ressalta
De acordo com Regina, a presença paterna tem dois componentes importantes: o primeiro é o apoio e a contribuição no exercício da maternidade. O outro é o auxílio dos cuidados essenciais com a criança.
Saiba Mais
O que diz a lei
Quem pode adotar: Adultos com mais de 21 anos, independentemente do estado civil, pode ser solteiro, casado, divorciado, ou viver em concubinato. Qualquer pessoa que seja pelo 16 anos mais velha que a criança
Quem não pode adotar: Menores de 18 anos. Os avós ou irmãos da criança pretendida. O tutor não pode adotar o tutelado
Quem pode ser adotado: Crianças e adolescentes com até 18 anos a partir da data do pedido de adoção
KARLA CAMILA
Repórter