O Brasil deve reconhecer o casamento gay?
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- 30-12-2010
30.12.10
NÃO
A Igreja Católica reconhece a dignidade de todas as pessoas e não as define nem rotula segundo sua orientação sexual. A pessoa humana ?feita à imagem e semelhança de Deus? dificilmente pode ser descrita adequadamente através de uma referência redutiva à sua orientação sexual.
O Catecismo da Igreja Católica exige que os homossexuais sejam ?acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza? e condena ?todo sinal de discriminação injusta? contra eles. Ao afirmar a dignidade de pessoas que são homossexuais, a Igreja está sendo coerente com seus ensinamentos.
Em matéria de sexo há dois princípios fundamentais que orientam o ensinamento da Igreja. O primeiro é que a Igreja ?sempre ensinou que a expressão sexual genital do amor, conforme o plano criador de Deus tem seu lugar exclusivamente dentro do casamento entre um homem e uma mulher?. O segundo é que ?a expressão sexual genital do amor tem que ser aberta à possível transmissão de nova vida?. Por estas razões a Igreja Católica não aprova casamentos ou uniões homossexuais.
O documento da Congregação para a Doutrina e Fé ?Considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais? (2003) afirma que ?não existe nenhum fundamento para equipar ou estabelecer analogias, mesmo remotas, entre uniões homossexuais e o plano de Deus sobre o matrimônio e a família. O matrimônio é santo, ao passa que as relações homossexuais estão em contraste com a lei moral natural?.
Segundo o moralista, o Pe. Dr. Marciano Vidal uma atitude pragmática começa a se advertir, tanto por parte da reflexão teológica-moral como por parte do episcopado. Ele cita que ?os bispos suíços não se opõem a um ordenamento jurídico das uniões homossexuais, ainda que defendam ?que o caráter único do matrimônio entre homem e mulher seja protegido pela jurisdição do Estado de maneira incondicional?.
Ante a pergunta se uniões homossexuais poderiam receber uma benção não sacramental, os bispos suíços responderam ?temos a convicção profunda de que as pessoas homossexuais podem ser abençoadas, mas não a contração de uma união homossexual?. O canonista Dias Moreno, afirma que o matrimônio é ?o que tem sido sempre em todos os contextos culturais ? uma união essencialmente heterossexual fundada na mesma configuração e estrutura da pessoa sexuada. A expressão sexual, física e afetiva, daqueles que são portadores da tendência homossexual, não pode ser equiparada à expressão heterossexual. Qualificar as uniões homossexuais de matrimoniais e dotá-las de uma configuração jurídica igual ou semelhante ao matrimônio, suporá, como primeiro efeito nocivo, dar passagem a um equívoco absurdo?.
Brendan Coleman Mc Donald
Redentorista, Ph.D. em Educação e em Psicologia, doutor em Teologia e prof. aposentado da UFC
SIM
A palavra casamento está intimamente ligada ao conceito de família. Falar em casamento entre parceiros do mesmo sexo é preciso antes classificar e identificar a família contemporânea. E a família mudou, está mais complexa e em constante evolução. A inserção da mulher no mercado de trabalho, os constantes divórcios, a diminuição das diferenças hierárquicas entre pais e filhos e ainda a manipulação genética da prole são alguns fatores que desencadearam essas mudanças, dando à palavra família um novo conceito.
Tanto é verdade que o próprio Código Civil substituiu a palavra pátrio poder, que denominava apenas o homem como o chefe da família, por poder familiar, igualando, assim, o homem e a mulher como sujeitos de direitos e deveres mútuos dentro da família.
Não há dúvidas de que famílias continuam sendo constituídas e formadas segundo os moldes tradicionais, por pai, mãe e filhos, porém outras formas de organização familiar foram surgindo dentre elas famílias repartidas pelo divórcio, famílias constituídas por um único progenitor, famílias com filhos adotados ou com bebês oriundos de reprodução assistida, famílias constituídas por pais homossexuais masculinos ou femininos, com filhos também adotados ou de proveta e ainda filhos de casamento ou relação heterossexual anterior e, por fim, casais sem filhos.
Em meio às mudanças surge a família homoafetiva que tem como base o afeto e um projeto de vida em comum, onde a sexualidade é só um dos fatores dessa constituição e que não pode por si só macular a sua grandeza. A despeito da omissão do legislador ainda inerte e preso às concepções particulares é a Justiça a grande protagonista dos avanços no que diz respeito ao reconhecimento das uniões homoafetivas como entidade familiar.
O que se busca hoje no Brasil é o reconhecimento e a equiparação da união homoafetiva à união estável entre homem e mulher, afim de que sejam reconhecidos aos parceiros homossexuais direitos legais de guarda e convivência com os filhos, adoção, direitos previdenciários e direito à herança. Tanto os projetos de lei no Congresso Nacional como as decisões judiciais espalhadas por todo País visam à inclusão das uniões homoafetivas no regime jurídico da união estável.
Já o casamento civil entre homossexuais nos moldes argentinos reflete um momento político e histórico daquela sociedade. No Brasil apesar de não se ter uma lei que garanta os direitos civis de homossexuais também não existe proibição expressa. Sobretudo para que o casamento homossexual se torne uma realidade dependerá primeiramente do reconhecimento legal da união homoafetiva como união estável e posteriormente de uma mudança de paradigma do legislador que deverá acompanhar os anseios e transformações sociais. O que importa e ainda carece no Brasil é a atitude de revestir essas uniões de segurança jurídica, seja dando a elas o status de união estável ou a permissão para o casamento.
Chyntia Barcellos
Advogada especialista em Direito das Famílias, Sucessões e Direito Homoafetivo – chyntia@chyntiabarcellos.com.br
SIM
A união entre pessoas do mesmo sexo bem como a criminalização da homofobia (o ódio, a intolerância e o preconceito contra pessoas homossexuais) são assuntos que a sociedade tem discutido cotidianamente, frutos de uma intensa pressão política dos movimentos sociais que há muito vêm lutando pelo reconhecimento e pela garantia da equidade de direitos das pessoas LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais).
Desde que nascemos somos orientados culturalmente pela família, escola, igreja, Estado a sermos heterossexuais. Admitir o relacionamento entre homem e mulher como a única forma possível de vivência da sexualidade não só limita os prazeres, sentimentos e sensações das pessoas como também gera todo um ciclo de violências, sendo a população LGBT alvo constante de piadas, agressões e até assassinatos. A sexualidade e sua livre expressão é fundamental para o desenvolvimento humano. Manifestar sentimentos e vivenciá-los nas mais variadas práticas afetivo-sexuais é algo normal em relacionamento hétero ou homosexual.
A Argentina reconheceu a união homoafetiva demonstrando ser um Estado laico de fato, não regendo suas leis conforme alguns (des)valores cristãos, e também, por entender que os direitos sexuais são fundamentais para todos/as, independente da orientação sexual. No Brasil, já temos vários exemplos de reconhecimento das uniões homoafetivas pelos tribunais, e também no Ceará, baseados nos princípios da dignidade humana e da igualdade. Em decisão pioneira, a Justiça cearense reconheceu a união civil entre duas mulheres. Isso demonstra que o Judiciário tem percebido e reconhecido os novos arranjos familiares, ao contrário do Legislativo que, infelizmente, não tem avançado nessas questões.
É importante salientar que em Fortaleza muitos foram os avanços para a garantia, a promoção e a efetivação dos Direitos Humanos da população LGBT. Uma das iniciativas mais significativas foi o reconhecimento da Prefeitura às uniões entre pessoas do mesmo sexo concedendo, em 2006, através da Lei Municipal nº 9.636, benefícios previdenciários aos companheiros ou companheiras homossexuais dos/as servidores públicos municipais. O reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo não só garante o direito à livre manifestação da sexualidade como também assegura aos envolvidos/as o direito a pensão em caso de morte do(a) cônjuge, pensão alimentícia e herança, bem como outras garantias.
Faz-se urgente e necessário que o Estado, nas suas mais diversas instâncias e poderes, reconheça e proteja a união civil entre pessoas do mesmo sexo, garantindo a eles/as todos os direitos e garantias que um casal heterossexual possui no matrimônio. Afinal, segundo a Constituição Federal, somos iguais perante a lei, não sendo admitida qualquer forma de preconceito e discriminação.
Orlaneudo Lima
Coordenadoria da Diversidade Sexual da Prefeitura
de Fortaleza