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Repetição de indébito na seara cível

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24.02.2011 Direito & Justiça
A repetição de indébito, ou devolução do que foi pago, ou cobrado, indevidamente, possui estrita pertinência com as relações cíveis. Tanto o Código Civil (Lei nº 10.402/2002) quanto o de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) possuem previsão ao reportado instituto jurídico, existindo, no entanto, diferenças entre a repetição na seara civil e na consumeirista.
Necessário, entretanto, definir em que circunstâncias legais se faz presente a repetição de indébito, na relação de consumo e nas eminentemente cíveis, ou conjuntamente em ambas.
O Código Civil, no art. 940, preceitua que ?aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.? Poder-se-ia, numa análise mais superficial, ou na busca pela prestação de jurisdição muito mais votada ao aspecto indenizatório do que propriamente de cunho de penalidade cível, tentar estender o conceito do vocábulo ?demandar? por também ?buscar extrajudicialmente?, para os fins do intento da repetição do indevido. Referido entendimento é rechaçado pela própria lei civil, a qual (Lei nº 10.406/2002), em seu art. 941, aduz que as penas previstas no art. 940 ?não se aplicarão quando o autor desistir da ação antes de contestada a lide?. Desse modo, no âmbito civil, apenas se pode ter a repetição do indébito quando há cobrança, judicialmente, por quantia indevida.
Não havendo ação judicial, não há que se falar em pedido para pagamento em dobro, em que pese poder o prejudicado pedir ?indenização por algum prejuízo que prove ter sofrido?(art. 941). Uma inscrição em cadastro de negativação, mesmo que indevida, a remessa de correspondência indicando débito a pagar, e tudo o mais que venha a ser cobrado extrajudicialmente, mesmo que indevidamente, sob o ponto-de-vista estritamente cível, não autoriza o pedido de pagamento em dobro da quantia cobrada.
Necessário ser visto ? e aqui rapidamente se abre um parêntese na discussão, saindo-se da seara do direito material e passando ao direito processual ? que em situação tal (cobrança judicial indevida) deverá o prejudicado se submeter ao dissabor (em havendo, realmente, a cobrança indevida) da lide judicial. Haverá uma demanda aforada, em que ao réu (prejudicado) caberá promover a devida defesa, na forma autorizada no art. 297 do CPC. Surgirá, com a protocolização da contestação, o contraditório e, somente com a sentença transitada em julgado é que, em seguida, poderá o prejudicado buscar a repetição do indébito.
Melhor sorte terá o prejudicado se a aludida demanda (em sendo indevida) se instaurar no juizado especial (Lei nº 9.099/95), ou se, mesmo no foro comum, a ela for dado procedimento sumário. É que nestes casos a lei processual permite o chamado pedido contraposto (art. 31 da Lei nº 9.099/95 e art. 278, § 1º do CPC). Aqui, logo na defesa, deverá/poderá o réu prejudicado, além de aduzir suas razões de defesa, pedir, como se estivesse demandando contra o autor, seja este (o autor) condenado ao pagamento, em dobro, da quantia cobrada indevidamente. Virá a sentença e tudo, de acordo com a instrução probatória, será esclarecido com a prestação da jurisdição. De todo modo, deixando-se o aspecto processual de lado, na seara de cunho cível, somente surgirá direito à repetição de indébito quando existir cobrança judicial indevida.
Nas relações estabelecidas, em que se tem a ingerência do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, necessário observar que somente ocorre o direito à repetição do indébito quando se aplica ao caso o disposto no parágrafo único do art. 42 do CDC. Dizendo de modo explicado: ?o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso…,? (Parágrafo Único do art. 42 do CDC).
No caso da relação de consumo, então, em suma, mostra-se como condição ?sine qua non? não só que tenha sido o consumidor cobrado indevidamente, mas, sobretudo, que efetive o pagamento indevido.
Ao arremate, e de modo simplório e prático, tem-se o direito à repetição do indébito ? cobrança em dobro do que cobrado indevidamente ?, nas relações de consumo, quando o consumidor é cobrado indevidamente e paga o débito indevido. Não é necessário, nesta situação, que haja cobrança judicial; mas se mostra imprescindível que seja o indevido débito pago.
Nas relações cíveis, no entanto, para que se possa cobrar o dobro por quantia buscada indevidamente, necessário que seja o prejudicado demandado, em juízo, para pagamento do que considera indevido.
Rodrigo Ribeiro – Pós-graduando em Direito