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Município de Fortaleza deve criar comissão para avaliar pessoas com cardiopatia grave visando concessão do acesso gratuito ao transporte público

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O Poder Judiciário estadual determinou que o Município de Fortaleza, por meio da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor), institua uma Comissão de Avaliação de Deficiência, para avaliar pessoas acometidas de cardiopatia grave objetivando a concessão do acesso gratuito ao transporte público em Fortaleza. A decisão é da 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), que manteve a sentença de 1º Grau.

“À luz dos princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia, revela-se legítima a intervenção do Poder Judiciário para impor à Administração Pública, no caso o Município de Fortaleza e a Etufor, obrigação de fazer consistente na criação de instrumentos e mecanismos para a avaliação da deficiência de pessoas acometidas de cardiopatia grave, segundo o critério biopsicossocial, para fins de concessão de gratuidade no serviço de transporte público urbano de Fortaleza, garantindo-lhes ampla acessibilidade e mobilidade, e possibilitando o rompimento de barreiras que as impedem de exercer com plenitude os seus direitos, notadamente o acesso ao adequado tratamento de saúde”, afirmou na decisão a relatora do processo, desembargadora Joriza Magalhães Pinheiro, sendo acompanhada à unanimidade pelos demais integrantes do colegiado.

De acordo com os autos, o Ministério Público do Ceará (MPCE), após reclamação de uma portadora de cardiopatia grave, que teve negado pela Etufor o passe-livre para fins de fruição de benefícios e concessão de recursos financeiros assistenciais, ingressou com uma ação civil na 12ª Vara da Fazenda Pública da Capital. O órgão ministerial requereu a inclusão das pessoas acometidas com a referida doença nas políticas públicas municipais. Alegou que cardiopatas graves devem ser considerados, para todos os efeitos, como pessoas com deficiência em relação à acessibilidade e gratuidade no serviço público de transporte urbano, conforme disposto na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (nº 13.146/2015).

Na contestação, a Etufor sustentou que o caso da mulher com cardiopatia grave não observa o cumprimento dos preceitos da Lei Complementar nº 57/2008, já que a patologia apresentada por ela não consubstancia deficiência, pois não compromete sua funcionalidade. Defendeu ainda que as hipóteses delineadas na referida lei constituem rol taxativo e não exemplificativo.

Em novembro de 2021, o Juízo da 12ª Vara da Fazenda Pública julgou procedente o pedido do MPCE determinando ao Município de Fortaleza o estabelecimento permanente de contratação de equipe multiprofissional e interdisciplinar, que atenda as demandas no âmbito municipal, em caráter emergencial, para que seja criada, inicialmente, uma Comissão para Avaliação de Deficiência, devendo nesta constar uma equipe exclusiva para avaliação da deficiência no caso de pessoas com cardiopatia grave, sob pena de multa no valor de R$ 5 mil para o Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos do Estado do Ceará.

Requerendo a reforma da sentença, a empresa ingressou com recurso de apelação (nº 0165939-60.2018.8.06.0001) no TJCE, alegando os mesmos argumentos da contestação.

Ao analisar o caso, em 13 de março deste ano, a 3ª Câmara de Direito Público manteve, por unanimidade, a decisão de 1º Grau. “Nessa perspectiva, constata-se que milhares de pessoas acometidas de cardiopatia grave e sujeitas aos mesmos obstáculos em seu ambiente social têm o seu direito à acessibilidade e à gratuidade no transporte público municipal tolhido, dificultando o acesso ao tratamento da saúde, haja vista que, com base em critério exclusivamente médico-pericial e diante da inescusável omissão estatal em implementar a avaliação biopsicossocial, não são reconhecidas como indivíduos com deficiência”, ressaltou a relatora.

Para a desembargadora, “o rol de deficiências elencado no artigo do 2º da Lei Complementar Municipal nº 57/2008 não deve ser visto como hermeticamente fechado, em caráter taxativo. Ao revés, deve ser interpretado em conformidade com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao regramento jurídico interno com natureza constitucional, e com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, de modo a se conferir máxima efetividade aos direitos assegurados aos portadores de deficiência e garantir a sua plena inclusão social em igualdade de condições com as demais pessoas”.

Além desse processo, a Câmara julgou mais 156 processos. Também integram o colegiado os desembargadores Maria Iracema Martins do Vale, Washington Luis Bezerra de Araújo (presidente), Maria Vilauba Fausto Lopes e Francisco Luciano Lima Rodrigues.