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A criação da delegacia de defesa do consumidor

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27.02.2011 economia
Na reunião da Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Ceará realizada na terça-feira, 23 de fevereiro deste ano foi debatida a necessidade de criação de vara e delegacia especializada em defesa do consumidor no Ceará e a coluna de hoje propõe-se a contribuir para este importante debate.
Quanto mais se sabe sobre determinado assunto, maior é a possibilidade de se prestar um atendimento mais eficiente e célere. E o mesmo acontece com o Direito: quanto mais complexos e diversos os conflitos, mais ramos do Direito surgem para compreender e propor regulamentação daqueles fatos sociais, e, portanto, maior a necessidade de conhecimentos específicos sobre cada um deles. Já temos demonstrado, ao longo de nossas colunas, o quanto o contrato de consumo é diferente do contrato civil (contratos entres iguais regulados pelo Código Civil); o quanto a relação de consumo nasce de uma relação de desigualdade (seja técnica, jurídica, econômica, informacional) e tem relação com as atividades econômicas, o que exige a regulação especifica do Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor ? CDC. E sabendo disso, o nosso CDC, na Teoria Geral do Direito do Consumidor, em o seu artigo 4º indica os princípios deste ramo do direito e no art. 5º determina que para a execução da Política Nacional de Defesa do Consumidor precisamos de defensoria, advocacia, promotoria, judiciário e delegacias especializados. Ainda não temos na maioria dos Estados brasileiros (inclusive no Ceará) Judiciário nem Delegacias especializados. Tal ausência decerto se deve a juventude do direito consumerista (20 anos em termos históricos é quase nada) e a consequente incompreensão das vantagens, necessidades e peculiaridades desta especialização.
Um exemplo
Para se ter uma ideia concreta dos motivos do artigo 5º do CDC determinar a especialização, vamos a um caso concreto: um consumidor contrata um seguro residencial. Recebe, 15 dias após a contratação, a sua via. Nela existe, sem destaque, uma cláusula que diz que o seguro não cobrirá casos de furto qualificado, mas não explica o que seja furto qualificado. Da casa do consumidor são subtraídos vários objetos; quando o consumidor vai acionar o seguro, simplesmente lhe é dito que tal fato não estaria coberto por se tratar supostamente de furto qualificado. Se não fosse uma relação de consumo (consumidor ? fornecedor) mas se tratasse de relação empresarial (fornecedor ? fornecedor) certamente a cláusula teria validade, mas sendo de consumo, não. Para ter validade conforme o CDC não basta que esteja formalmente no contrato, é preciso que o consumidor tenha entendido prévia e claramente o que estava contratado, explicado o que seria furto qualificado etc. É óbvio que tal ?olhar consumerista? pode acontecer sem uma vara especializada mas é igualmente certo que tal direito seria mais fácil, rápida e eficientemente exercido com a especialização e consequente estudo e aplicação mais profunda do microssistema do consumidor. E, ademais, foi esta a receita, o método determinado pelo Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor e que ainda não foi devidamente testado e aplicado. Além disso, a especialização tem sido uma tendência em vários setores da vida contemporânea e vem chegando nas instituições públicas e contribuindo para a maior eficiência.
E tem muito mais
As relações de consumo estão cada vez mais complexas e específicas, a exigir uma atenção especial e um acumulo maior de conhecimentos específicos.
Alguns exemplos:
a) em casos de plano de saúde deve existir o diálogo entre o CDC e a Lei dos Planos de Saúde (Lei 9656/98) e os normativos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS);
b) em casos que envolvam usuário de serviço público, o diálogo entre o CDC, a Lei de Concessões de Serviço Público e as agências reguladoras;
c) há regras próprias para o processo civil do consumidor,
d) a responsabilidade civil do fornecedor é dividida em duas esferas distintas (uma visa manter o contrato e recuperar a confiança do consumidor; a outra, reparar o prejuízo);
e) a proteção do consumidor, em todos os aspectos, deve ser equilibrada, não podendo inviabilizar o necessário desenvolvimento econômico e tecnológico etc. Um contrato de consumo, repita-se, é bem diferente de um contrato civil.
Além de tantos outros motivos ? e o principal deles ser a efetivação do CDC ? trata-se de tema ainda mais relevante quando lembramos que em 2014, pela primeira vez, sediaremos jogos da Copa do Mundo e o turista, em regra, seja um consumidor por excelência.
Você sabia que…
…o CDC determina que as informações prestadas pelo vendedor vinculam o fornecedor?
…o artigo 34 do CDC diz que fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos?
Fique atento
É considerado prática abusiva (e, portanto, proibida) a cobrança de tarifa dos consumidores pelo pagamento mediante boleto/ficha de compensação. Tal cobrança se existente seria o mesmo que uma dupla remuneração do banco pelo mesmo serviço.SOBEFISCALIZAÇÃOReforço na fiscalização das violações de direitos do consumidor: PROCON FORTALEZA passou a contar com mais 14 agentes fiscais.DESCEINFORMAÇÃOAumento do número de transgênicos sem clara identificação ao consumidor.
Amélia Rocha
economia@opovo.combr