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62% das queixas no Decon resolvidas sem ir à Justiça

Ouvir: 62% das queixas no Decon resolvidas sem ir à Justiça

11.09.2010 negócios
Reclamação na maioria dos casos foi sanada antes de processo, concluindo-se de modo amigável
Fortaleza/ São Paulo – O Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon) recebeu mais de 10 mil atendimentos no período que compreende o início do ano até nove de setembro último. Destes, 62% foram resolvidos antes mesmo de se gerar um processo na Justiça, ou seja, foram concluídos de forma amigável entre as partes reclamante (o consumidor) e reclamada (geralmente, empresas de produtos e prestação de serviços).
Há duas décadas, antes da implantação do Código de Defesa do Consumidor (CDC), essa estatística seria impossível de ser real. Considerado um divisor de águas nas relações de consumo, na opinião de inúmeros especialistas, a legislação completa, hoje, seus 20 anos de existência no País.
Para um dos criadores do código, o advogado e ex-procurador geral de Justiça de São Paulo, José Geraldo Brito Filomeno, o código mudou a visão do consumidor e dos fornecedores. “As empresas viam o CDC como um perigo à ordem econômica, mas hoje o aplaudem. Até porque, com a globalização da economia, o código tem sido encarado como o indutor da qualidade dos produtos colocados no mercado nacional e internacional”, diz Filomeno.
“No Brasil, as pessoas dizem que há leis que pegam e que não pegam. Essa pegou. Os próprios fornecedores responsáveis pelos produtos e serviços estão mais preocupados em cumprir o Código. O consumidor, na outra ponta, está mais consciente e reclamando mais os seus direitos”, analisa o promotor de Justiça, João Gualberto Feitosa, secretário-executivo do Decon.
Ele lembra que antes da implantação do CDC, essa relação de consumo era muito mais desigual. “Antes, o que vigorava era o Código Civil, de 1916. O consumidor não era reconhecido como tal, até porque a lei não era de caráter de proteção a ele como é hoje. Além disso, não havia ainda a inversão do ônus, quando cabe ao fornecedor provar que aquele fato danoso ao consumidor não ocorreu”, explica o promotor.
Conforme os dados fornecidos pelo Decon, apenas 22% dos atendimentos realizados entre primeiro de janeiro até quinta-feira passada foram transformados em reclamação, ou melhor, oficializados como ações na Justiça. De acordo com João Gualberto, isso ocorre por conta da própria sistemática de atendimento. “Depois de atendido, é feita uma Carta de Informações Preliminares (CIP). O reclamado tem até 10 dias para contactar o cliente e resolver o problema. O processo só segue adiante se após esse prazo não houver acordo”, resume.
Novos vilões
Segundo os especialistas, telefonia, planos de saúde e bancos respondem pelo maior número de queixas de consumidores em todo o período de existência do CDC. As queixas quanto à informação prestada, qualidade do serviço e cobranças indevidas superaram os setores de habitação e mensalidade escolar, maiores problemas na época da criação da lei.
No Estado, os “Assuntos Financeiros” (bancos, empresas financiadoras e operadoras de cartão de crédito, principalmente) são os campeões de reclamação do Decon, com 47,98% de participação de todos os atendimentos feitos neste ano. “Em compensação, são essas empresas que mais negociam com o consumidor antes de ir para Justiça. De cada 100 casos, só 36 retornam para seram formalizados como reclamação e vão para a Justiça”, assinala Gualberto.
Entre os temas mais solicitados, “Produtos” vem logo em seguida, com 26,72%, à frente de “Serviços Essenciais”, com 13,91%. Este último, revela queda de reclamações na comparação com a média de 2009 e 2008, respectivamente, 16,06% e 17,58%. No Ceará, segundo o levantamento do Decon, as mulheres representam 52,5% dos que mais procuram os serviços do órgão e, por conseguinte, exercem de maneira mais atuante sua cidadania. Quanto à faixa etária mais presente, são pessoas entre 31 e 40 anos. Já a respeito dos horários mais movimentados, o destaque fica para pico de atendimentos identificado entre 9 e 10 horas, quando 41,5% de toda demanda do dia é atendida.
Procon Fortaleza
Quando surgiu há praticamente cinco anos o Procon Fortaleza atendia em média entre 10 e 15 consumidores da Capital, diariamente. Essa média saltou para 100 pessoas por dia, atualmente. Essa evolução, de certa forma, amenizou o volume da demanda do Decon.
“O CDC contribuiu muito para que as pessoas ficassem mais conscientes. Além disso, o alto grau de resolução das demandas traz credibilidade aos órgãos de defesa do consumidor”, afirma o assessor Jurídico do Procon Municipal, Airton Melo.
O órgão é o único Procon do País que realiza, pela internet, audiências virtuais, que nada mais são que conferências entre reclamante, reclamado e conciliador sem a necessidade de deslocamento. O procedimento, pioneiro no País para este fim, já realizou 39 audiências de março para cá, desde quando foi implantado. “Isso gera economia de tempo e custos. Há interesse de outros Procons municipais em adotar esse sistema. A ideia é ampliar em Fortaleza e replicar a ideia para o restante do Brasil”, afirma Airton.
DEFESA
Posse da nova secretária executiva no dia 15
A procuradora de Justiça, Vanja Fontenele Pontes, será a nova secretaria-executiva do Decon, nomeada pelo Ministério Público do Estado. A posse será na próxima quarta-feira, dia 15, no Espaço Cultural da Procuradoria Geral de Justiça. Vanja já comandou o órgão de defesa do consumidor entre 1995 e 1996, quando o cargo ainda era formalizado como de coordenadora.
Ela irá assumir a função por dois anos e substituirá o atual secretário-executivo João Gualberto Feitosa. Sobre os desafios a serem enfrentados, ela comentou que a educação financeira precisa ser levada mais a sério para a eliminação de entraves.
“Se tivermos uma geração educada no futuro, os princípios de relação de consumo irão se transformar em costume, sem a necessidade de leis. Até porque o consumo desenfreado provoca vários problemas”, analisou Vanja.
Ela destacou, também, os 20 anos do Código de Defesa do Consumidor. “Costumo dizer que o CDC foi um marco no ordenamento jurídico brasileiro, que ajudou a pensar o direito como agente de promoção do sujeito e no coletivo”, disse.
ILO SANTIAGO JR.
REPÓRTER