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Pulseiras no lugar de grades

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22/11/2010 Polícia
Autoridades defendem o monitoramento dos detentos como solução para a crise que atinge o Sistema Penal do Ceará
O Estado do Ceará poderá, já em 2011, amenizar a grave crise de superlotação de detentos em seu Sistema Penitenciário. Se depender das autoridades da Justiça e do Ministério Público, os presos que têm direito ao regime semiaberto e aqueles que, mesmo estando no regime fechado, apresentam bom comportamento e podem exercer trabalho externo, poderão trocar as celas dos presídios, penitenciárias ou casas de custódia por prisão domiciliar, com o uso obrigatório de pulseiras ou tornozeleiras eletrônicas.
Os dois apetrechos eletrônicos permitem às autoridades rastrear os detentos durante 24 horas, sabendo exatamente onde eles estão. A aplicação da medida e as suas consequências foram motivo de uma ampla discussão durante o XVII Fórum de Ciência Penal, organizado pela Procuradoria Geral da Justiça (PGJ). O evento ocorreu na semana passada e reuniu várias autoridades do Judiciário, Ministério Público, advogados e estudantes de Direito.
Defensor
O promotor de Justiça Sílvio Lúcio Correia Lima, que atua como representante do Ministério Público junto à Vara das Execuções Criminais e Corregedoria dos Presídios, defende a implantação do sistema de monitoramento eletrônico dos presos. Segundo ele, Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e o vizinho Estado da Paraíba já adotaram o sistema de uso de tornozeleiras ou pulseiras em parte de sua massa carcerária.
Segundo ele, a lei federal de número 12.258, de 15 de junho deste ano, possibilitou o uso de equipamento de vigilância indireta pelos presos condenados.
Para Sílvio, uma das vantagens com a implantação do novo sistema é uma drástica redução nos índices de superlotação nas unidades penitenciárias do Estado, como está ocorrendo atualmente. Por conta da proibição de entrada de novos detentos nos presídios da Grande Fortaleza, mas de 680 presos estão, atualmente, literalmente ´empilhados´ nos xadrezes das delegacias da Polícia Civil.
Transferidas
Uma das últimas contagens feitas pelas autoridades indicou a presença de, nada menos, que 686 detentos nas DPs, sendo 538 em delegacias distritais e metropolitanas e outros 148 nas Delegacias Especializadas.
Na semana passada, o juiz titular da Vara das Execuções Criminais e Corregedoria de Presídios, Luiz Bessa Neto, autorizou a transferência para o Instituto Presídio Feminino Desembargadora Auri Moura Costa, em Aquiraz, de 30 mulheres que estavam detidas nas carceragens de delegacias da Polícia Civil, por terem sido presas em flagrante delito ou terem sido capturadas por ordem judicial (prisões preventiva ou temporária). Já em relação à transferência de presos do sexo masculino, a proibição ainda está valendo.
Economia
O promotor Sílvio Lúcio tem mais um argumento que reforça a sua defesa pela implantação do sistema de monitoramento de presidiários no Ceará. Segundo ele, isto representaria também uma economia nos recursos despendidos pelo Estado com o seu Sistema Penal.
“Atualmente, cada preso custa para o Estado, mensalmente, a quantia entre R$ 1.400,00 a R$ 1.500,00. Com a efetivação do sistema de vigilância eletrônica, este custo cairia para menos de R$ 1 mil”.
O promotor ressalta ainda que, de acordo com o que estabelece o artigo 36 da Lei das Execuções Criminais, “o preso condenado – mesmo em regime fechado – tem direito ao trabalho externo, desde que obedecidas as devidas cautelas contra fugas e em favor da disciplina”.
“Mas, nenhum preso em Fortaleza tem tido esse direito exercido, por exclusiva falta de escolta. Talvez, com a implantação do sistema, muitos terão o direito ao trabalho externo reconhecido”, ressalta o representante do MP. Outras autoridades participantes do Fórum manifestaram-se a favor da medida.
TRABALHO EXTERNO
Promotor diz que lei não está sendo cumprida
“Não temos nenhum apenado em Fortaleza exercendo trabalho externo, como diz a lei. O nosso regime fechado é alinhavado e o aberto, escancarado. Esta é a nossa realidade”.
A declaração é do promotor de Justiça Sílvio Lúcio Correia Lima, que representa o Ministério Público Estadual junto à Vara das Execuções Criminais e Corregedoria dos Presídios na Capital. Como participante do XVII Forum de Ciência Penal, Sílvio debateu com outras autoridades as alternativas para o cumprimento das penas.
Na tentativa de acompanhar mais de perto a realidade dos prisioneiros nas unidades carcerárias existentes na Grande Fortaleza, a Justiça e o Ministério Público têm realizado, todos os meses, visitas de inspeção nos presídios e Casas de Privação Provisória da Liberdade, as CPPLs, ou Casas de Custódia. Na semana passada, os representantes do MP inspecionaram a CPPL I, em Itaitinga, e constataram a superlotação nas celas.
REALIDADE NO CEARÁ
Presos do semiaberto ainda em celas
O sistema de vigilância eletrônica ainda é só um projeto no Ceará, onde as unidades estão abarrotadas
Desde 2008, o Estado de São Paulo adotou o sistema de vigilância à distância, através de monitoramento, para os presos que cumprem pena em regime semiaberto. Naquele ano, o então governador José Serra, assinou lei estadual que permitia a execução do sistema. Na primeira etapa, 20 mil mulheres condenadas e que já tinha progredido do regime fechado para o semiaberto puderam cumprir a pena de modo domiciliar, ou exercer algum trabalho externo.
No Ceará, os presos em regime semiaberto ainda não foram beneficiados com o moderno modelo de cumprimento de pena e são obrigados a retornar às cadeias nos fins de semana, no período noturno ou, ainda, têm que apresentar-se todos os meses perante a Justiça. Muitos estão recolhidos nas unidades que já superlotadas de detentos do regime fechado. Essa mistura tem trazido graves problemas para o Sistema Penal.
Interditado
Recentemente, a Justiça determinou a interdição da Colônia Penal Agropastoril do Amanari, situada no Município de Maranguape, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), unidade que tinha a missão de abrigar os detentos do regime semiaberto. Porém, a superlotação nos fins de semana começou a gerar vários problemas e uma série de denúncias graves.
Uma delas, informava que alguns presos dirigiam-se à unidade em seus veículos e neles dormiam diante da falta de vagas nas celas. Outra denúncia revelou a ingestão de bebidas e drogas, além de constantes fugas.
Por conta disso, a Justiça, através de sua Vara específica, determinou a interdição.
Para tentar solucionar o fato, a Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) decidiu cumprir a ordem judicial e transferir os apenados em regime semiaberto para o antigo Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira (IPPOO I), localizado no bairro Itaperi. Entretanto, as condições de segurança ali são poucas.
À exemplo das demais unidades carcerárias cearenses, o ´velho´ IPPOO apresenta uma estrutura completamente degradada. As tentativas de fuga são constantes e o presídio também deverá fechar as portas.
Regulamentar
Apesar de ter entrado em vigor em junho último, precisamente no dia 15, a lei de número 12.258, que alterou o Código Penal e a Lei de Execução Penal, não foi ainda regulamentada na parte em que trata da implementação da monitoração eletrônica. No artigo terceiro, consta que, “caberá ao Poder Executivo” regulamentar o assunto. A mesma legislação define que, “caberá ao juiz definir a fiscalização eletrônica quando autorizar a saída temporária no regime semiaberto e na prisão domiciliar”.
Fique por dentro
O que diz a lei
Conforme o artigo 36 da Lei das Execuções Criminais, o trabalho externo para os presos em regime fechado somente será admissível em serviço ou obras públicas, realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina. Também estipula o limite máximo de presos em dez por cento do total de empregados na obra. Caberá ao órgão da administração, à entidade ou á empresa empreiteira a remuneração desse trabalho. A prestação de trabalho à entidade privada depende do consentimento expresso do preso. O detento só poderá trabalhar fora da cadeia se tiver cumprido o mínimo de um sexto (1/6) da sua pena.
NO BRASIL
Oitenta mil detentos poderão ser monitorados
Segundo dados do Ministério da Justiça, através do seu Departamento Penitenciário Nacional (Depin), com a entrada em vigor da lei que permite a implantação do sistema de vigilância eletrônica dos presos, cerca de 75 mil a 80 mil detentos poderão sair das cadeias.
Os internos serão controlados e supervisionados por funcionários do Sistema Penitenciário brasileiro, que poderão visitá-los e terão de apresentar-se imediatamente caso sejam convocados. O Ministério da Justiça calcula que, o sistema de controle eletrônico permitirá desafogar o penitenciário, com a libertação de até um sexto dos reclusos. Trata-se de presos que não são considerados perigosos e que representam 17 por cento do total de internos nas cadeias em todo o Brasil.
Ceará
Conforme dados da Secretaria da Justiça e Cidadania do Ceará (Sejus), nas unidades carcerárias da Grande Fortaleza e, ainda, nas penitenciárias de Sobral e Juazeiro do Norte, estão recolhidos 9.557 detentos. Destes, 7.178 cumprem regime fechado. Os demais estão no semiaberto. A Justiça cearense não sabe ainda quantos presos locais poderão ser colocados em vigilância eletrônica.
FERNANDO RIBEIRO
EDITOR DE POLÍCIA