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Neutralidade de juízes e juristas

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14.02.2011 Político
Todo jurista opta por valores, decide por um determinado tipo de sociedade à qual serve. A suposta neutralidade é hipócrita, não corresponde à verdade dos fatos. O juiz deve ser neutro à face das partes porque é o fiel da balança. As partes apresentam suas razões. O juiz deve decidir com independência: retilíneo diante dos poderosos, compreensivo com os humildes. Já quando se trata de optar por valores éticos e jurídicos, o juiz não é neutro. Todo juiz carrega no um conjunto de ideias.
14.02.2011 Política
Há escolhas a serem feitas. Os juízes devem ser honestos consigo mesmo reconhecendo que fazem escolhas e honestos perante o grupo social afirmando as escolhas que fizeram. Abaixo a hipócrita neutralidade de advogados, procuradores, juízes, desembargadores, ministros! Essa neutralidade sempre protegeu escolhas de conservação das estruturas. Decidamos por qual mundo lutaremos, que interesses consideramos legítimos.
O jurista tem uma tarefa na construção da democracia real, que não se confunde com a democracia de fachada. A democracia real é obra de artesanato. Não virá de cima para baixo. Terá sua gestação no processo democrático, com todas as suas dificuldades. O jurista, que optou pela transformação social, deve ter ouvidos para os clamores de justiça do povo.
Optar por um projeto de mundo fundado na igualdade e que abomine todas as formas de exploração do ser humano. Entrar em relação de comunhão com as classes populares, ungido na opção pelos deserdados da lei. Colocar seu saber a serviço dessa causa. Agir criativamente em busca de novos institutos jurídicos, novas interpretações que contemplem os que sempre estiveram à margem dos direitos. Ao advogado também cabe agir criativamente buscando novas sendas, atalhos que socorram o grito dos que estão famintos de Justiça. Deve o advogado explorar as contradições do sistema legal, um veio tão rico para avançar conquistas populares.
O sistema legal, mesmo tentando legitimar interesses das classes dominantes, tem de fazer concessões. A própria capacidade hegemônica do Direito está na dependência de que suas determinações assumam um caráter de igualdade em certos direitos e deveres, como observou o cientista político Emir Sader. O jurista que optou pelo lado dos oprimidos deve procurar dar vida a certos princípios constitucionais programáticos, colocados às vezes sem propósito de real vigência no texto da Constituição.
Que Direito será o mediador da obra de artesanato democrático que os juristas devem ajudar a realizar? Será ?um direito permanentemente inacabado?, como proclamou o Movimento Nacional de Direitos Humanos. Será um Direito que se recusa a ver o mundo e a sociedade como naturalmente harmônicos, sob a égide imparcial do Estado (Rui Portanova). Será um Direito ideologicamente definido, como toda concepção de Direito é, diferindo apenas de outras concepções porque opta pelos empobrecidos, pelos despojados, não legitima as opressões.
João Baptista Herkenhoff – Palestrante, escritor, professor pesquisador da Faculdade Estácio de Sá de Vila Velha (ES)
jbherkenhoff@uol.com.br