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Juízes querem mesmos direitos de promotores

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Por Alessandro Cristo
O pedido feito por juízes federais ao Conselho Nacional de Justiça, para que tenham os mesmos direitos de integrantes do Ministério Público quanto a férias e benefícios extras no ordenado, levanta novamente a discussão sobre o quanto a Justiça paga pelo tempo em que magistrados passam parados. A classe já encontrou resistência no Senado Federal, que não vê com bons olhos a aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional que aumente o número de dias de folga. Para a Ordem dos Advogados do Brasil, a questão é lógica: quanto mais descanso, mais tempo os processos esperam nas estantes judiciais.
Defensor da autonomia do Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça foi chamado para dar nova interpretação à Lei Orgânica da Magistratura, autorizando os magistrados a venderem um terço das férias e a receberem auxílio-alimentação e auxílio-moradia, assim como promotores e procuradores da República. O motivo da equiparação é alinhar as duas funções públicas, aproximadas pela Emenda Constitucional 45, de 2004, como explica o juiz Fernando Mattos, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, autora do Pedido de Providências.
A encruzilhada é que só a venda da terça parte dos 60 dias de férias a que têm direito os magistrados custaria aos cofres federais R$ 234,7 milhões ao ano, segundo reportagem publicada no domingo (29/11) pela Folha de S.Paulo. Gozado, no entanto, o período de descanso ajuda a compor os seis meses que os julgadores passam parados anualmente, o que resulta em maior demora nos julgamentos.
Prestes a ser votada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a PEC 48/09 já ganhou alguns narizes torcidos. A proposta original, do senador Valter Pereira (PMDB-MS), previa que, aos 60 dias de parada certa, fossem adicionados ainda outros 19, decorrentes do período de recesso forense entre 19 de dezembro e 6 de janeiro de cada ano. O fim de ano ganharia, assim, as férias coletivas para juízes e servidores, e o pit stop de um mês mais que esperado pelos advogados.
Mas essa soma não estava nos planos da OAB, como afirma o diretor tesoureiro e futuro presidente da entidade, Ophir Cavalcante Junior. ?A pausa nas publicações garantiria férias aos advogados, que hoje não podem parar. Mas a PEC criava um exagero?, diz. Foi o presidente da Comissão, o senador Demóstenes Torres, quem bateu o pé. Se os juízes não aceitassem incluir o recesso forense no período de dois meses a que têm direito, até os 60 dias estariam em risco. A ideia acabou democraticamente acatada. A Justiça fica de 19 de dezembro a 19 de janeiro funcionando apenas em regime de plantão, em férias coletivas, e esse tempo é contado como metade das férias a que os magistrados têm direito. A proposta pode ser votada pela CCJ já na semana que vem.
Mesmo assim, os dois meses de descanso ainda estão muito além do que gozam trabalhadores em regime de CLT. ?Os membros do Poder Judiciário são os únicos que trabalham dez meses e ganham 13?, afirma Cavalcante. A razão que diferencia os magistrados dos demais empregados, porém, é justamente a flexibilidade do regime de trabalho, segundo Fernando Mattos. ?O juiz não tem sábado e domingo, não ganha hora extra, não tem limite de horas trabalhadas. Muitas vezes leva trabalho para casa e é obrigado a morar em locais de difícil acesso?, explica.
Além disso, segundo o presidente da Ajufe, os atrativos da função existem para torná-la desejável pelas mentes mais capacitadas. ?A questão é: que juiz queremos? A magistratura não pode ser uma atividade de passagem, mas o ápice dos mais vocacionados?, afirma.
O prêmio, no entanto, é caro. Reportagem publicada pela ConJur em 2006 mostrou que os juízes trabalham apenas metade do ano. Pelo menos seis meses viram vapor em fins de semana, feriados e emendas, férias, recessos e outras folgas. São os 11 feriados que qualquer brasileiro tem, outros 20 dias de recesso no fim de ano e mais sete feriados exclusivos. Além das férias de 60 dias por ano, há ainda oito dias de folga quando o juiz casa ou quando morre alguém da sua família, mais dois anos remunerados para dedicação aos estudos. Feriados estaduais e municipais também entram na conta.
Em um Tribunal de Justiça como o de São Paulo, por exemplo, que tem 360 desembargadores, os dois meses de férias dos desembargadores equivalem a 60 magistrados parados a cada mês, o que movimenta juízes convocados para substitui-los. Esses juízes deixam para trás os processos de suas próprias varas, mas recebem uma gratificação pelo serviço a mais ? que não é descontada dos ordenados dos titulares nas câmaras, mas dos cofres públicos. ?Não tem estrutura organizacional que suporte isso?, diz um integrante do CNJ que defende o fim da regalia e também da licença-prêmio, pela qual, a cada cinco anos, o juiz ganha três meses de férias.
No CNJ, o pedido de equiparação da Ajufe está empatado em um a um. A votação começou no dia 13 de outubro, e mais 13 conselheiros ainda devem votar. O relator, conselheiro José Araújo Costa Sá, indicado no Conselho pelo Ministério Público, é favorável aos argumentos, mas votou contra por entender que ?a solução proposta ultrapassa os limites da competência administrativa atribuída a este Conselho?. A sessão foi suspensa por um pedido de vista do conselheiro Marcelo Neves, depois do voto do conselheiro Felipe Locke aprovando o pedido.