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Imprensa e Justiça

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24.02.2010 opinião
Com 37 anos de exercício profissional do jornalismo, continuo sem entender o mecanismo da definição de pautas da imprensa brasileira, pelo menos aquela definição classifica da relevância do fato e do interesse coletivo, enfatizada nos bancos da universidade e no início da vida profissional por muitos mestres do batente. Também não compreendo os meandros das decisões judiciais, onde pelo menos nunca militei e não tenho nenhum mestre.
Francamente, não sei se é a efemeridade dos fatos ou mesma a falta de memória da imprensa brasileira, mas não compreendo como não sai com todo destaque no noticiário nacional a libertação de um dos assassinos de um dos crimes mais covardes e cruéis que já se teve notícia neste País: o garoto João Hélio, arrastado até a morte, preso ao cinto de segurança, após o assalto do carro de sua mãe, pelas ruas do Rio de Janeiro, em 2007. A criança de seis anos foi arrastada por longo percurso e teve o corpo todo mutilado e o rosto totalmente desfigurado.
Pois é, um dos quatro autores da barbárie, que à época era menor de 18 anos, foi solto após cumprir, por três anos, pena sócio-educativa em instituto do gênero, conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente. A notícia do crime, que ocupou durante longo tempo os principais espaços da mídia, desmilinguiu-se em notas esparsas do noticiário. E olha que o assassino construiu uma folha corrida de crimes no instituto sócio-educativo de fazer inveja a muito bandido temido: outras quatro passagens na polícia, todas ocorridas durante sua internação, incluindo a tentativa de assassinato de um agente de disciplina, motim e duas tentativas de fuga.
Além da discrição da mídia, esse lamentável episódio remete-nos, mais uma vez, ao debate sobre a questão da fixação do limite etário para a responsabilidade penal, objeto de constantes e inúmeras discussões, sendo tema de grande polêmica, observado que intelectuais, de vários segmentos, aí incluídos respeitados juristas, antropólogos, sociólogos e militantes de direitos humanos se posicionam, terminantemente, contra a possibilidade de menores de 18 anos serem processados criminalmente.
No Brasil, a lei permite aos menores de 18 anos, ainda que já possam votar e influenciar nos destinos do país, estuprar, matar, torturar, esquartejar e outras barbáries desde que, caso capturados, cumpram o máximo de três anos de internação (21 anos é o limite), em estabelecimento educacional, com direito extralegal a participar de rebeliões, provocar danos ao patrimônio público, além de fuga. Esta indulgência plena, concedida a menores, sob a proteção da criminologia (sociológica) da compaixão, deve ser rediscutida com seriedade. Ainda bem que já está em estudo a possibilidade de mesmo, após os 21 anos, esses criminosos continuarem o cumprimento da pena. Um pequeno avanço, que a sociedade precisa apressar e ampliar.
Carlos Alberto Alencar – Jornalista