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Impasses levam Justiça a assumir atribuições de prefeitura

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29.03.11
Liminar para construir postos de gasolina, instalar outdoors, erguer prédios. Divergências de interesses entre empresários e órgãos ambientais, que poderiam ser resolvidos no âmbito administrativo, têm sido solucionados na Justiça e, segundo o titular da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semam), Deodato Ramalho, sem o mesmo rigor às leis que regem a cidade.
Os casos mais graves são dos postos de gasolina, como O POVO vem noticiando há uma semana. Conforme Deodato, com a liminar, o juiz consolida uma conduta que não respeita as leis ambientais. ?Obviamente, a construção foi liberada sem atender aos requisitos traçados em lei. Isso traz consequência futura muito grave?, declara.
A liminar é uma medida precária e pode ser derrubada, explica Ramalho, mas muitos empresários iniciam a construção e se valem da teoria do fato consumado para garantir o funcionamento do empreendimento. O Município sempre recorre destas decisões, mas nem todas as liminares são suspensas. ?A gente não vê em Fortaleza nenhum prédio ser demolido depois de pronto?, reforça.
Segundo o presidente do Sindicato dos Revendedores de Combustíveis do Ceará (Sindipostos), Guilherme Meireles, na prática, o empresário pede licença para construir o posto, a Semam constata que está irregular e indefere. Daí o empresário fica insatisfeito, entra na Justiça e consegue a liminar.
?Eu acho que está errado. Ou a lei serve pra todo mundo ou serve só para meia dúzia de ?inteligentes? que têm acesso à Justiça. Se é assim, então explode logo a cidade toda?, critica.
Ele argumenta que as liminares ferem a concorrência, pois de um lado ficam as pessoas que respeitam a lei e não conseguem montar seu negócio e, do outro, as pessoas que têm bom acesso à Justiça e conseguem ferir a legislação.
Demora e prejuízos
A decisão de ingressar com pedido de liminar se pauta, muitas vezes, pela demora para conseguir licença ambiental, afirma o presidente da Associação Cearense de Magistrados (ACM), Renato Roseno. ?Alega-se prejuízo ao empreendimento privado em virtude da demora do Estado. Aí, a Justiça resolve tutelar esse direito e conceder as liminares?, explica.
Ao conceder uma liminar, o juiz se baseia na ?fumaça de bom direito? (elementos mínimos que qualificam o pedido) e no ?perigo da demora? (o que gera danos à parte interessada).
Roseno compreende que essas decisões judiciais sejam criticadas, mas defende que o sistema processual dá a possibilidade, já que todo cidadão que se sente lesado pode entrar na Justiça. Ele explica que a ACM tem buscado sensibilizar os magistrados para que estejam atentos à efetividade dos direitos fundamentais, especialmente dos direitos coletivos, relacionados à tutela do meio ambiente equilibrado.
Por quê
ENTENDA A NOTÍCIA
Liminares que permitem o funcionamento de postos de combustíveis, construção de prédios e instalação de outdoors acendem a polêmica sobre o Judiciário estar intervindo nos campos do Executivo e do Legislativo
SAIBA MAIS
De acordo com o titular da Semam, Deodato Ramalho, a demora para conseguir uma licença ambiental não deve ser usada como desculpa, pois precisam se programar para isso. ?Quando o projeto chega à Semam correto, demora entre três e quatro meses para sair a licença?.
Presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (Sinduscon), Roberto Sérgio Ferreira, explica que as construtoras só levam a questão para a Justiça quando seus direitos foram tolhidos. ?Tem solicitação de alvará que em seis meses não sai?, reclama.
Lucinthya Gomes
lucinthya@opovo.com.br