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Emoção e revolta no último adeus

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06.04.11
Fortaleza
Em uma de suas últimas frases, Henrique Maria da Silva, 23, confessou estar com o coração apertado. Pouco antes de morrer, o maitre jogou uma partida de futebol com os amigos nas proximidades do restaurante Pasto & Pizza da Washington Soares. Seria a derradeira vez.
Acostumado a dar carona a um dos companheiros, na garupa da moto, Henrique contou a um garçom que a aflição era de saudade da filha de dois anos, Ana Camile. Os dois, entretanto, não se encontrariam mais.
Um dia depois, na despedida de Henrique no cemitério Jardim do Éden, em Pacatuba, familiares e amigos lhe disseram adeus com lágrimas e aplausos. Na manhã de ontem, os presentes no enterro pediam por justiça.
O rapaz, recém promovido a chefe dos garçons do restaurante, foi morto na madrugada de segunda-feira, por volta das 3 horas, quando voltava do ?racha? com os companheiros de trabalho. Um carro conduzido pelo juiz de Direito Aristófanes Vieira Coutinho Junior colidiu com a moto guiada pelo jovem na avenida Washington Soares e arrastou Henrique por 115 metros. O rapaz chegou a ser atendido, mas morreu a caminho do hospital.
Henrique não se formou em Redes de Computadores, seu sonho; não trocou a moto, veículo que julgava perigoso, por um carro. Também não acompanhará o aniversário da mulher amanhã, quando Neiriane Alencar completa 24 anos. Planos interrompidos. ?O pior foi o juiz ter sido apreendido e solto em seguida. Causa revolta?, diz, emocionado, o sogro de Henrique, Neri Lourenço, 45.
A missa de corpo presente foi celebrada em uma funerária da avenida Heráclito Graça pela manhã. Na despedida, os irmãos, pais e a esposa acompanharam o corpo até o local do sepultamento em silêncio. À medida em que o caixão era colocado na abertura, o choro foi ficando mais alto.
Exemplo da casa
O irmão mais novo de Henrique, Gabriel da Silva, 13, não saía de perto da mãe em nenhum instante. Muito emocionado, o rapaz continha os sentimentos para dar conforto à mãe, dona Gabriela.
Primeiro de cinco filhos, entre eles, gêmeos de 19 anos e uma menina de 16, Henrique era o exemplo de todos eles. ?Perdemos um irmão e amigo maravilhoso?, resume, às lágrimas, a irmã Graziele.
Colega da faculdade, Lívio Maia, 22, lembra o quanto o amigo estava empolgado com o curso. ?Ele tinha ambição na medida certa. Queria crescer, como qualquer pessoa, mas sem passar por cima de ninguém?, comenta. ?Para fazer amigos, era fácil, fácil?, afirma.
O patrão e tio da esposa de Henrique, Waldemir Alencar, diz que o empenho e a amizade do rapaz farão muita falta. ?Ele ajudava a família financeiramente. Não tinha nenhum vício. Mas não dizem que os bons morrem jovens??.
O quê
ENTENDA A NOTÍCIA
O maitre Henrique Maria da Silva morreu na madrugada da última segunda-feira, após ter sido atropelado por um veículo dirigido pelo juiz Aristófanes Vieira Coutinho Júnior. O magistrado será julgado pelo Tribunal de Justiça.
ENTENDA O CASO
Por volta de 1 hora da madrugada da última segunda-feira, os funcionários do restaurante em que Henrique (foto) trabalha se reuniram para jogar futebol, como acontecia todos os domingos após o expediente.
Aproximadamente às 3 horas, o juiz Aristófanes tentou fazer uma ultrapassagem na avenida Washington Soares, próximo à Ceará Auto Shopping.
O carro colidiu com a moto pilotada por Henrique. O motociclista foi arrastado por cerca de 115 metros. Ele ainda chegou a ser socorrido, mas morreu a caminho do hospital.
SAIBA MAIS
A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) define: Art. 33 – São prerrogativas do magistrado: II – não ser preso senão por ordem escrita do Tribunal ou do órgão especial competente para o julgamento, salvo em flagrante de crime inafiançável, caso em que a autoridade fará imediata comunicação e apresentação do magistrado ao Presidente do Tribunal a que esteja vinculado (vetado).
Segundo a Polícia Rodoviária Estadual, o juiz Aristófanes Vieira Coutinho Junior fez o teste do bafômetro e o resultado deu positivo. ?O exame indicou índice de 0,82 mililitros (de álcool no ar expelido)?, informa o comandante da PRE, coronel Túlio Studart.
Angélica Feitosa
angelica@opovo.com.br