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A batalha pelo verde no bairro Cocó

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22.03.11
Área verde que integra o Cocó vem sendo objeto de disputa entre empresários e comunidade, que vê possibilidade de construção de prédios como retrocesso Da varanda do amplo apartamento, que fica no 12º andar do prédio na esquina das avenidas Sebastião de Abreu e Padre Antônio Tomás, região nobre de Fortaleza, a médica Rosemary Campos relatou algo que, pelo modus operandi, faz o cearense lembrar-se de episódio recente.
?Vieram num feriadão, na calada da noite?, diz, referindo-se a um grupo de pessoas que esteve nas dunas do Cocó, em frente ao condomínio onde mora. ?Foi em 2009. Arrancaram coqueiros daquele canto?, e aponta uma clareira, debruçando-se no parapeito. ?Havia muitas outras árvores. Passaram uns tratores, mas a população impediu.?
O espaço, objeto de disputa entre poder público e empresários, tem 15 hectares de dunas e vegetação típica de mangue. Não é cercado, apresenta monturos de lixo em trechos mais próximos às avenidas. Em junho de 2009, por iniciativa do vereador João Alfredo (Psol), tornou-se Área de relevância e interesse ecológico (Arie). Entretanto, a Arie só seria sancionada em outubro do mesmo ano.
De lá para cá, porém, a lei enfrenta uma verdadeira via-crúcis jurídica. Em janeiro do ano passado, seus efeitos foram suspensos pelo Tribunal de Justiça do Ceará.
A área, em torno da qual se debatem interesses públicos e privados, vem mobilizando a vizinhança do Cocó. Ainda em 2009, um abaixo-assinado reuniu três mil pessoas que explicitavam sua discordância quanto à intenção de construir um empreendimento sobre as dunas. Rosemary fez parte do movimento. A juíza Valdenisa Bernardo também. ?Há 11 anos que moramos ali. Em dezembro, houve uma invasão. Um homem se dizendo dono chegou. Tiraram árvores?, narrou Valdenisa.
Dona Astrid (não quis informar o sobrenome) revela: a comunidade tem se empenhado em vigiar a área. ?Minha filha, que é advogada, foi até processada. É a única pessoa civil que foi processada pelos empresários?, protesta. A moradora conta que as administrações dos condomínios do entorno das dunas do Cocó foram acionadas judicialmente. Até quem não tinha relação com a batalha.
O quê
ENTENDA A NOTÍCIA
Lei que cria a Arie das dunas do Cocó enfrenta grande quantidade de pedidos de vista no Tribunal de Justiça do Ceará, o que a impede de ser praticada. Construtoras pressionam órgãos a emitir licença ambiental.
O QUE DIZ A LEI
Área é disputada por empresários
O POVO tentou falar com a Associação Cearense de Construtores e Loteadores (Acecol), que interpôs, no Tribunal de Justiça do Ceará, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a lei municipal 9.502, de 7 de outubro de 2009, conhecida como Lei Dunas do Cocó. Entretanto, nenhum contato (telefônico, de fax, de e-mail ou endereço) foi encontrado.
O POVO também procurou o Sindicato da Indústria da Construção do Estado do Ceará (Sinduscon) para obter informações sobre a Acecol. A assessoria do Sinduscon informou que a entidade, se existe, não tem qualquer vínculo com o sindicato. Em rápida pesquisa na Internet, não foram encontradas páginas que remetessem à Acecol, exceto aquelas que dizem respeito à querela das dunas.
O artigo 16 da lei 9.985/2000 define uma Arie como região, em geral, de pequena extensão, pública ou privada, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais próprias ou que abriga organismos vivos raros. A Arie das dunas do Cocó foi sancionada em outubro de 2009 pela Prefeitura de Fortaleza.
ENTENDA O CASO
Em janeiro de 2008, a Prefeitura de Fortaleza anunciou uma ofensiva
contra os outodoors.
À época, falava-se na retirada de todas as placas em três meses.
A prefeita Luizianne Lins dizia acreditar uma adaptação do mercado de comunicação às novas regras.
A ação, porém, atrasou. Novas previsões da administração municipal datavam o início dos trabalhos para março/abril. Contudo, um ano depois, tudo ainda não passaria de teoria. Correndo por fora, empresas articulavam contra-ofensiva.
Somente em julho de 2009, a Prefeitura iniciou um diagnóstico da poluição visual de Fortaleza. A princípio, sabia-se que a capital cearense estava, proporcionalmente, mais suja do que São Paulo antes de uma operação similar.
Em outubro de 2009, placas da avenida Gomes de Matos começaram a ser retiradas. Em um mês, foram 108 equipamentos.
Em 24 de novembro, calendário de retirada de outdoors começa a ser executado. No total deste primeiro momento, seriam 51.
Um dia depois, a avenida Washington Soares começa a ser limpa. A via era considerada a mais poluída visualmente da Cidade.
A mobilização adentrou 2010, com retiradas de outdoors de avenidas como Santos Dumont, Antônio Sales, Bezerra de Menezes, Gomes de
Matos, Alberto Magno e Washington Soares.
Em 2009, a Semam diz ter retirado 541 placas irregulares.
No caso das 4 liminares deste ano, a Secretaria garante que vai recorrer da decisão.
Denúncias de placas irregulares podem ser feitas ao Fala Fortaleza (0800 285 0880).
Henrique Araújo
henriquearaujo@opovo.com.br