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Justiça pra inglês ver

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30.08.2009 caderno gente
De Brasília
Os meios de comunicação do mundo, e ,em especial da Europa, deram grande destaque à condenação de duas jovens inglesas – Shanti Andrews e Rebecca Turner – a um ano e cinco meses de prisão, penas depois convertidas na prestação de serviços comunitários, além de multa equivalente a 26 salários mínimos. Elas foram presas por falsa comunicação de crime e tentativa de estelionato, ao chegarem ao Rio de Janeiro, por terem forjado o roubo de suas bagagens, para receber indenização. Na verdade, os estrangeiros se surpreenderam com a eficiência da polícia e da justiça brasileiras. Foram apenas 24 dias desde o auto de prisão à sentença de condenação. Um recorde, sem dúvida. Nem o desconhecimento da nossa língua pelas rés atrapalhou.
Nunca na história deste País se viu justiça tão eficiente e rápida. Mas enquanto ingleses e outros bestas admiram o feito do juizado carioca, nós aqui nos perguntamos: por que todos os processos na nossa justiça não correm com a mesma celeridade? O País está cheio de ladrões e outros criminosos soltos, rindo na cara do povo, exercendo mandatos e cargos importantes em todos os níveis nos três poderes da República. Seus processos mofam nas gavetas e prateleiras dos tribunais, quase sempre prescrevendo sem julgamento. Quantos processos o juiz que condenou as jovens inglesas julgou com a mesma rapidez? O mundo está admirando a exceção, a raridade. Agora sabe que no País em que só vão para a cadeia pobre, preto e prostituta, tentar um golpe para receber o seguro de uma mala é uma prática hedionda. Principalmente se o criminoso for estrangeiro. Dá cadeia. Que o digam Shanti e Rebecca. Mas roubar descaradamente o dinheiro público, emitir decreto secreto, fraudar concorrências, receber propina, vender passagens do legislativo, superfaturar obras públicas, tudo isso pode, sem risco. E no mais das vezes com a garantia da absolvição pelo calendário, garantida pelo famigerado foro privilegiado. O Brasil devia ter escondido essa sentença dos cidadãos. Pode gerar neles a falsa sensação de que, no Brasil, existe mesmo justiça.
Pelo menos naqueles milhões que esperam há anos o julgamento dos processos em que buscam alguma forma de Justiça que nunca são julgados. O caso das duas turistas inglesas não honra a magistratura brasileira. Pelo contrário, chama a atenção para o grande mar de injustiças formado por cerca de 100 milhões de processos sem julgamento nos diversos juizados e tribunais do País. O caso das jovens inglesas é apenas o que se pode chamar de Justiça para inglês ver.