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Existe interesse em proteger as leis de mercado ou as instituições financeiras?

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22.01.2011 Opinião
A questão do montante cobrado a título de juros pelas instituições financeiras em contratos de mútuo (empréstimo bancário) há muito é motivo de discussão; não apenas no Brasil, mas no mundo.
Contrapõem-se dois relevantes fatores: a) a liberdade de contratar, presente nas relações privadas típicas como pressuposto à existência da lei da oferta e da procura; b) a ação interventiva do Estado no domínio econômico, como meio de regular o mercado e coibir abusos por parte dos detentores do capital, especialmente em contratos de adesão, como é o caso do mútuo bancário.
O constituinte brasileiro dirimiu parcialmente essa controvérsia quando, por ocasião da edição da emenda constitucional nº 40/2003, revogou o parágrafo 3º do artigo 192, que limitava a taxa de juros anuais a 12% e admitia a caracterização de crime de usura em caso de descumprimento do preceito. Assim, na atual sistemática, não existe limitação constitucional na fixação da taxa de juros nos contratos de empréstimo bancário.
Por outro lado, nada impede que o legislador, por meio de lei ordinária, estipule uma limitação cominando, inclusive, pena para o descumprimento da norma. Para tanto, bastaria fazer incidir sobre as instituições financeiras os preceitos da Lei da Usura, atualmente em vigor. Resta saber se existe vontade política para tanto, haja vista que o Congresso Nacional, há menos de dez anos, extirpou a limitação de 12% ao ano.
Não existe dúvida que uma redução nos juros cobrados pelos bancos representaria progresso para o País na medida em que melhoraria o acesso ao crédito e traria inegável fomento ao setor produtivo. No entanto, existem pontos negativos que não podem ser olvidados, especialmente no que se refere ao controle da inflação.
É fato que o lucro do sistema bancário brasileiro está entre os maiores do mundo. Empréstimos com risco reconhecidamente baixo, como as carteiras para financiamento da habitação e consignados, ainda ostentam percentuais consideravelmente elevados. O governo tem tentado intervir estimulando a redução do spread bancário, como foi no caso da edição da nova Lei de Falências.
Entrementes, a redução esperada não ocorreu até o presente momento. O Superior Tribunal de Justiça, por seu turno, em recente julgado, da lavra do ministro Aldir Passarinho Júnior, entendeu que as disposições da moderna Lei da Usura (MP 2.172/2001), de fato, aplicam-se a todos, menos às instituições financeiras. Na prática, significa que a observância dos preceitos daquela lei é obrigatória, menos aos bancos, que podem cobrar de acordo com sua conveniência comercial.
É, portanto, algo a refletir: existe uma preocupação do legislador brasileiro em proteger as leis de mercado ou trata-se de mera proteção ao interesse econômico das instituições financeiras?
O governo tem tentado intervir estimulando a redução do spread bancário
Fabriccio Steindorfer
fabriccio@secrel.com.br
Prof. universitário, mestre em Ordem Jurídica Constitucional (UFC), doutorando (UnB) e advogado da União