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Doadores ilegais podem ser taxados pela Justiça

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21.05.2009 Política Pág.: 03
Bruno de Castro Da Redação
Seiscentos nomes levantados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por fazerem doações a campanhas cearenses nas eleições majoritárias de 2006 estão na mira do Ministério Público Estadual (MPE) e do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE). Suspeitos de terem ultrapassado os R$ 20mil permitidos pela Justiça, eles serão submetidos à apuração das prestações de contas. A medida está sendo adotada em todos os estados e o TSE suspeita de pelo menos 18 mil ?investidores? em todo o País, que podem estar envolvidos em crime de sonegação fiscal. Alguns não declararam Imposto de Renda (IR), mas, ainda assim, foram doadores.
Do total de indicados pelo TSE no Ceará, o Ministério Público deu entrada em representações contra 30 deles. O critério de ?seleção? dos doadores foi o volume de recursos liberados, que, segundo a Resolução n° 22.250/2006, não pode ultrapassar 10% do rendimento de pessoa física e 2% do faturamento bruto de pessoa jurídica. Os índices são sempre referentes ao ano anterior à eleição questionada.
A dedução do excesso foi feita pelo procurador da República no Ceará, Alessander Sales. Ele tomou como base as informações repassadas à Receita Federal nas declarações de IR. Essa é a primeira vez que um cruzamento de dados dessa natureza é feito no País. Agora, o material das representações está a caminho do TRE-CE, que fica responsável pelo julgamento e definição da penalidade aplicada, caso a irregularidade tenha mesmo sido cometida. Essa também é a primeira vez que o Tribunal é incumbido da atribuição.
Encarregado de acompanhar todos os perfis de possíveis ilegais, Alessander explica que a penalidade vem em forma de multa, prevista no artigo 23 da Lei 9.504 (Lei das Eleições). O valor fica entre cinco e dez vezes o diagnosticado como excedente e tem como destino o Fundo Partidário. Segundo ele, há casos de doação além do limite na monta de R$ 50mil. ?Aí, o pagamento [da multa] fica entre R$ 250mil e R$ 500mil. Vai ser bem oneroso para eles [os doadores]?, contabilizou.
Como restam cerca de 570 situações a serem analisadas, Sales previu o término do trabalho de produção das representações pelo MPE em até dois meses. Em seguida, o órgão aprofunda as investigações no tocante às eleições municipais de 2008. Até ontem, conforme ele, a lista do Ministério contava com 30 doadores ilegais do pleito. Porém, nenhum dos nomes ? tanto de 2006 quanto do ano passado – será divulgado até todos os processos serem concluídos. ?Correm [as informações] em sigilo fiscal?, justificou.
Alessander não indicou data para os julgamentos serem finalizados, mas disse esperar agilidade do TRE nesse sentido, pois, ao enviar a relação dos 600 doadores, o TSE pediu rapidez nas análises. ?Recebi um ofício do ministro Carlos Ayres Britto [do Tribunal Superior] dizendo isso. Em cada representação que é dada entrada, estou anexando esse documento?, revelou.
» À espera. Até as 18h de ontem, o Controle Interno do TRE ainda não havia recebido as representações contra os 30 maiores doadores ilegais. O setor é responsável pelo encaminhamento de demandas dessa natureza.
Após os processos darem entrada no Tribunal, o órgão comunica oficialmente cada doador da suspeita de doação ilegal. Com isso, permite-se que a defesa seja apresentada para o julgamento ocorrer com os apontamentos do Ministério Público e as justificativas/esclarecimentos do ?acusado?.
Contudo, mesmo com o pedido do TSE, a agilidade pode não ocorrer a contento. ?Para você ter uma ideia, tem conta de 2003 que até hoje não foi julgada?, pontuou o secretário do CI, Aurélio Timbó, complementando que, como esse é um procedimento novo no TRE, ?pode ser que os resultados saiam ainda esse ano?.
PONTO NEVRÁLGICO
A possibilidade dos doadores ilegais serem punidos pela Justiça Eleitoral vem justamente no momento em que se acirra o debate sobre a aprovação do projeto de reforma política brasileira, vigente desde 1946. Isso porque uma das propostas do Governo Federal é instituir o financiamento público das campanhas.
Dessa maneira, pretende-se coibir a corrupção eleitoral com a divisão dos recursos da seguinte forma: 80% entre os partidos proporcionalmente ao número de eleitos na última eleição, 19% entre as legendas com representação na Câmara e 1% entre as agremiações com estatuto registrado no TSE.
De acordo com o Governo, o texto propõe-se a acabar com o ponto nevrálgico do modelo atual: a sonegação de impostos e a existência do Caixa 2. ?É preciso realmente uma atenção especial para o tema do suprimento de recursos privados para as campanhas. Está mais do que provado que há fragilidade estrutural no processo eleitoral. Quem entra no jogo eleitoral se submete ao controle da lei?, argumenta o ministro Carlos Ayres Britto.
No Ceará, um dos deputados que mais tem defendido a reforma e o financiamento público é Artur Bruno (PT). Para ele, o fim do sistema em vigor hoje dará mais possibilidade de partidos pequenos debaterem em pé de igualdade com as grandes siglas, além de não deixar nenhuma legenda refém de empresas privadas. ?Todos os dias, vemos denúncias. Isso desmoraliza cada vez mais os políticos. É mais que chegada a hora da população exigir a reforma eleitoral?, defende.